18.12.06

Time Person of the Year: YOU


Parabéns, você foi eleito/a a pessoa do ano segundo o TIME Magazine.

E, para minha sorte, esse fenômeno dos espaços de afeto na Internet é o assunto da minha dissertação sobre linguagens experimentais da arte na Internet e objeto diário do meu dayjob como consultora de usabilidade e arquitetura da informação.

Eu penso em nós (eu , você, e "os outros" = nós) o tempo todo. Finalmente a nossa mobilização coletiva, a imagem do nosso fluxo, a nossa máquina desejante foram reconhecidos pelo nossos esforços diários em alimentar esta invenção maravilhosa e viciante. Nós mudamos a rede (com ela e por dentro dela), transformamos a nossa relação com o conhecimento, inventamos novas maneiras de conhecer "o outro", criamos milhares de novos artistas conceituais com os youtubes e flickrs, estreitamos fronteiras, aumentamos o volume da voz política (e da estupidez também) e até ganhamos dinheiro com ela.

Não é a rede. Somos nós.

(P.S.: Alguns trechos da dissertação "Frágeis Conexões" estão postados nesse blog, aberto a comentários, que serão publicados junto com a dissertação como formato acadêmico. É inspirado no formato de Fragmentos de um Discurso Amoroso, de Roland Barthes)

*******

Yes, you. You control the Information Age. Welcome to your world.

(...)
But look at 2006 through a different lens and you'll see another story, one that isn't about conflict or great men. It's a story about community and collaboration on a scale never seen before. It's about the cosmic compendium of knowledge Wikipedia and the million-channel people's network YouTube and the online metropolis MySpace. It's about the many wresting power from the few and helping one another for nothing and how that will not only change the world, but also change the way the world changes.

The tool that makes this possible is the World Wide Web. Not the Web that Tim Berners-Lee hacked together (15 years ago, according to Wikipedia) as a way for scientists to share research. It's not even the overhyped dotcom Web of the late 1990s. The new Web is a very different thing. It's a tool for bringing together the small contributions of millions of people and making them matter. Silicon Valley consultants call it Web 2.0, as if it were a new version of some old software. But it's really a revolution.

(...)

Who are these people? Seriously, who actually sits down after a long day at work and says, I'm not going to watch Lost tonight. I'm going to turn on my computer and make a movie starring my pet iguana? I'm going to mash up 50 Cent's vocals with Queen's instrumentals? I'm going to blog about my state of mind or the state of the nation or the steak-frites at the new bistro down the street? Who has that time and that energy and that passion?

The answer is, you do. And for seizing the reins of the global media, for founding and framing the new digital democracy, for working for nothing and beating the pros at their own game, TIME's Person of the Year for 2006 is you.

Sure, it's a mistake to romanticize all this any more than is strictly necessary. Web 2.0 harnesses the stupidity of crowds as well as its wisdom. Some of the comments on YouTube make you weep for the future of humanity just for the spelling alone, never mind the obscenity and the naked hatred.

But that's what makes all this interesting. Web 2.0 is a massive social experiment, and like any experiment worth trying, it could fail. There's no road map for how an organism that's not a bacterium lives and works together on this planet in numbers in excess of 6 billion. But 2006 gave us some ideas. This is an opportunity to build a new kind of international understanding, not politician to politician, great man to great man, but citizen to citizen, person to person. It's a chance for people to look at a computer screen and really, genuinely wonder who's out there looking back at them. (...)

16.12.06

Pós-humano, demasiado pós-humano

O sentido das redes para a vida hoje permite que a medicina estenda a vida que um corpo vegetativo através de máquinas e que um cadáver seja preservado em uma técnica contemporânea de embalsamento como a plastinação.

Stelarc é um artista que acredita e demonstra que as fronteiras entre homens e máquinas, arte e tecnologia, são membranas permeáveis. Reconhecido há décadas como um artista que leva a questão do pós-humano e a “terceirização” dos sentidos através da tecnologia, a sua obra gira em torno algo mais do que um uso solipsista das técnicas disponíveis.

Stelarc vê o corpo humano como uma arquitetura evolutiva, algo em fluxo e em permanente transmutação. As suas obras e máquinas-prótese põem em evidência a fragilidade do corpo humano e seus mecanismos de controle inerentes. O corpo é uma máquina que opera principalmente por movimentos espasmódicos involuntários, temperados pelo hábito de manter a máquina (ou organismo) girando – o corpo é um zumbi, puro autômato. Do ponto de vista das máquinas do desejo de Deleuze e Guattari, Stelarc se posiciona exatamente como tal: o seu corpo é uma máquina de produção.

No desejo de querer controlar a produção involuntária que é seu corpo, ele usa a tecnologia para tornar visível as possibilidades de (des)controle do seu corpo. Ao contrário da artista francesa Orlan que também usa o corpo como suporte para sua transformação/deformação estética, Stelarc não pretende modificar, inicialmente, a sua “arquitetura evolutiva”, mas sim potencializar e estender os sentidos através da mediação mecânica e eletrônica. Nesse sentido, ele está apenas continuando o que homem sempre fez, só que com os meios de hoje. Ele conclui que o ser humano sempre foi cyborg: desde a primeira pedra atirada para matar um coelho na boca da caverna o homem sempre criou instrumentos de projeção para alcançar além de seu próprio corpo.

Talvez a natureza não tenha sido suficiente conosco. Em “The Naked Ape”, Desmond Morris ressalta que nós, o macaco pelado, somos um acidente evolutivo que deu certo, o glitch na máquina de produção do gênero Homo que foi desembocar no Sapiens. Toda a nossa genialidade e diferença em relação ás outras espécies é decorrente dessa falha evolutiva. Só nos beneficiamos em duas questões: no cérebro mais capaz e no polegar opositor – exatamente as duas faculdades físicas que nos permite criar técnicas e fabricar objetos para suplementar a nossa falha em quase todo o resto. A nossa nudez nos obriga a nos vestir para nos proteger do frio ou calor, daí a invenção da costura e dos tecidos; precisamos construir abrigos contra a incerteza do clima, daí a arquitetura; a vulnerabilidade a doenças e a necessidade de combater a morte gerou a medicina; a necessidade de comunicação para transmitir códigos de sobrevivência gerou a linguagem e os sistemas de pensamento.

Jared Diamond em “The Third Chimpanzee” levantou, talvez, uma questão ainda mais fundamental para a sobrevivência da espécie humana diante de sua fraqueza biológica: o estrus (sio) feminino escondido e o coito privado. Assim foi inventado o amor, ou o desejo, ou a pura capacidade de produção. O macho que não consegue mais “ver” o sio da fêmea tem que adivinhar o seu período fértil para saber quando reproduzir. O coito privado cria exclusividades dentro do conjunto social e estimula a imaginação erótica acerca do “outro”, por extenso a força propulsora de tudo mais. Nesse complexo jogo de adivinhações e cortejamento, criaram-se códigos e comportamentos sociais que justificam a necessidade de estender-se além de si próprio, em uma espécie de darwinismo erótico em que ganha quem exibe desejo maior de sobreviver. Esse “desejo”, quando visto além da sexualidade, pode explicar

Segundo Stelarc, a tecnologia vem sublinhar esse desejo natural humano de ser maior do que si, de ser uma máquina de longo alcance. Quando ele convida usuários em 6 cidades a controlarem seus movimentos musculares á distância, músculos que são involuntariamente convidados a se movimentarem através de correntes elétricas no seu corpo, é criado um espaço de intimidade corporal entre aqueles que movimentam esse fantoche cyborg e os seus manipuladores por intermédio da rede. Nesse contato entre corpo e máquina, o clique do mouseem Berlim se trans-substancia em corrente elétrica que movimenta um músculo em Nova York. O homem, nesse caso o artista, relega o movimento do corpo à rede. O que vemos, na performance de Stelarc, é uma coreografia desses espasmos-clique que forma uma imagem da pulsação da rede através da pulsação do corpo. No caso de Stelarc o corpo é suporte e a rede é vetor.

A metáfora primata se sustenta no seguinte fato sobre essa instalação específica. Nela, os cliques na rede ativavam uma corrente elétrica que entrava pelo braço esquerdo e saía pelo direito, fazneod com que os músculso se contraíssem por condução elétrica da própria rede nervosa do corpo. Mas não pára por aí, não se trata apenas de uma dance macabre. A corrente que sai do braço direito, por sua vez, ativa uma terceira mão mecâmica acoplada a esse braço que reage a esse estímulo elétrico. Visualmente, ela é tão grande que parece a mão de um primata. Essa mão mecânica também não serve para muita coisa no mundo dos humanos pois não tem polegar opositor. A tecnologia, para Stelarc,, simboliza um eterno retorno ás ironias evolutivas do homem. Seus exo-esqueletos terminam transformando o corpo humano em si próprio, metáfora de si, uma máquina de desejo cujo objetivo é a própria produção de seus movimentos involuntários.

O espaço de intimidade, e, por extensão, do afeto, é criado na instalação de Stelarc subseqüente. Utilizando o mesmo partido de movimentação involuntária á distância e ativação do terceiro braço primal, ele acrescenta um novo elemento de proximidade: agora não basta que a sua rede neural física corresponda á rede neural telecomunicativa. Stelarc, o fantoche, quer conhecer seu puppeteer. Com um headset que transmite por webcam a imagem de quem o está manipulando, o fantoche pode começar a entender quem e o que o move, e, mais importante, porque o move. Uma espécie de boneca voodoo humana que quer conhecer seu karma.

O artista quer saber o que motiva seu corpo a se movimentar se ele não posso fazê-lo, quer saber porque Deus, o master puppeteer está fazendo isso e porque seu livre arbítrio o impede de interferir na Vontade Divina. O resultado é um espaço de intimidade comprimido no tempo e no espaço, uma imagem da rede pelo corpo e também pelo olhar. É a rede o espaço da performance, e não sómente o corpo. A performance na rede é a imagem pretendida. A rede é o vetor que envia a pulsação via as sinapses neurais da rede, enviando os impulsos da mesma forma, mas a ela se acrescenta o elemento cognitivo do conhecimento do "outro" que move a ação.

Nas obras mais recentes, o fenômeno de proximidade e da intimidade é levado ao extremo. Stelarc recentemente implantou um molde natural da própria orelha (um clone criado em laborátorio a partir da cultivação das células da própria orelha) no ante-braço esquerdo. Acoplada a essa orelha está um receptor Bluetooth, tecnologia que permite atender a chamadas telefônicas em um raio de até 10 metros do aparelho celular. A orelha clonada ouve ligações a partir de uma extensão auditiva tecnológica que integra o espaço neurológico e sensorial da rede: é um sistema integrado de telefonia biológica. O artista “ouve” pelo braço, pela sua carne fractal. Durante a palestra em que foi possível testemunhar a presença da orelha, saquei o meu telefone celular que tem Bluetooth e tentei mapear o seu dispositivo para poder fazer uma ligação “Fractal flesh” é o termo de Stelarc para designar órgãos remotos tecnologicamente conectados ao corpo, estendidos ou aumentados pela tecnologia. “O território do pós-humano podem muito bem não residir no campo dos corpos ou das máquinas mas no campo dos fantasmas – entidades inteligentes, autônomas e operacionais sustained na rede. O corpo é o lugar do ponderável e do mortal. Um avatar não tem órgãos.” Na concepção deleuziana, o avatar é o próprio corpo-sem-órgãos.

Stelarc propões um jogo de reversões que incorpora, de certa forma, as fantasias figurativas Dadá. A orelha implantada lembra as alegorias macabras de Dali, com orelhas penduradas em galhos como órgãos-sem-corpo, em uma tentativa de isolar o espaço auditivo de um corpo consciente inserido na paisagem.

11.12.06

New Media...tão "New" assim?

(Ou “peraí, o que se pode fazer com a rede que não era possível fazer antes?”)

Utilizar novas técnicas não implica necessariamente em fazer uma arte nova. Pelo contrário. Muitas vezes, o artista pode cair em deslumbramento diante das possibilidades que a tecnologia propõe e que o mercado de gadgets disponibiliza. O que caracteriza o artista, talvez, é a busca de algo que realmente represente as inquietações, os prazeres e a consciência da atualidade, seja através das redes ou não. Um artista não consegue escapar ao seu tempo – de certa forma a presença do ser no espaço e no tempo – o Dasein – é o que informa a sua experiência. Mas, quando um artista decide operar dentro de um contexto sociológico, ou um meio ou um suporte, e delineia um território e uma estratégia para sua arte, esta escolha possui suas implicações tanto formais quanto de conteúdo, narrativas, além de possuir questões políticas.

O público, por sua vez, ao maravilhar-se com a novidade técnica, pode perder seu senso crítico devido ao contágio do deslumbramento do artista, ou por pura sedução das máquinas através do hábito de apertar botões. Mas, não seria justamente esse fascínio a fonte de uma visão crítica sobre a própria tecnologia? O que importa, para o artista, é estar consciente dos anseios do indivíduo, sabedor das realidades locais e pleno dos processos no mundo. Independentemente da técnica utilizada, importa realizar um trabalho que, como conceito, esteja imerso na atualidade.

9.12.06

Ídolos

A esquerda precisa de ídolos. Quando Fidel se for, quem será o ídolo da esquerda?

Já estou imaginando o PCI (Partido Comunista de Ipanema) se reunindo nos botecos depois da praia defendendo emocionalmente as medidas do grande herói e libertador latino-americano, Hugo Chávez. Nas rodas acadêmicas da UFRJ, Chávez será laureado como nosso grande defensor contra os porcos capitalistas que só servem para nos explorar, coitados de nós.

Deus me livre.

Three threats to the Survival of New Media Art

Site genial sobre as ameaças à sobrevivência da new media art.

As ameaças são:

- arquivistas demais, "animateurs" de menos
- advogados demais, ativistas de menos
- acadêmicos demais, artistas de menos

Maneiras de conter essas ameaças:
  • Link to work you respect
  • Insist on open access
  • Contribute to the discussion
  • Wipe PowerPoint from your harddrive
Aparentemente, um new media artist usando Powerpoint é muito prego...oops....

Do Real ao Virtual

No final dos anos 80 até o início dos anos 90, curadores de arte e fotografia e teóricos começaram a analisar o significado da tecnologia da imagem digital em relação ao status e á prática fotográfica. A facilidade e rapidez com que tecnologias da imagem digital se tornaram disponíveis na época para um público profissional e amador permitiu o surgimento da idéia de que essa transformação significava uma mudança paradigmática. A tecnologia digital parece abalar definitivamente a suposta credibilidade da imagem fotográfica como documento e gerou tanto uma nova gama de soluções, quanto de problemas, como a transmissão e o armazenamento de imagens, hoje produzidas de forma exponencial.

Com o crescimento e a ubiqüidade do uso da computação móvel e da Internet, esse fenômeno se acentuou ainda mais até o ponto em que hoje evidenciamos um mundo gerido pela informação visual gerada por milhares de câmeras digitais disparando cliques e publicando imagens para acesso do público a todos os momentos, em qualquer lugar do mundo. Se por um lado, a Internet permitiu que o acesso á recepção e transmissão de informação saísse da mão de ‘experts’ e residisse na mão de qualquer pessoa, este fenômeno também permite que existam desvios de percepção sobre o que realmente é um fato ou mera simulação. A opacidade da questão da legitimidade em relação ás imagens foto-jornalísticas, por exemplo, gira em torno de questões de quem seria o “dono do fato”, já que a notícia há muito já não é domínio exclusivo das agências de notícias e de seus enviados especiais.

Se a questão digital permite que mentiras se tornem verdades sem meios de provação concreta, o inverso também é verdade. Há anos jornalistas vêm criando blogs para escreverem tudo o que o jornal não lhes permite publicar. Blogs tornaram-se, na realidade, muito mais autênticos do que os jornais e sua parcialidade, pois o blogueiro não responde a ninguém a não ser a si próprio. Blogs, por exemplo, também dão vazão à criação de identidades fictícias, alter-egos que escrevem através de pessoas e que criam comunidades inteiras de pessoas “reais” em torno de um autor “fake” e talvez em torno de eventos e notícias falsas. Talvez diante de toda a falsidade de personas e eventos, esta seja uma verdade em si, se for consistente.
Estes desdobramentos desviantes do acesso à informação são indícios de uma histeria coletiva, ao mesmo tempo em que talvez a Internet seja um dos lugares em que pessoas não precisem representar os papéis de acordo com os interesses de suas organizações. A maleabilidade do meio parece se prestar tanto a teorias conspiratórias e apocalípticas quanto a uma utopia que o mundo real mais opaco não permite. No final, é uma questão de percepção e saber como navegar pelo labirinto da informação guiados por uma intuição do que é legítimo ou não, pois em um universo paralelo sem um pai, prevalece a anarquia.

O que acontece com os blogs “extra-oficiais” também ocorre no universo do arquivo de imagens e filmes. Sites como Flickr e Youtube são verdadeiros repositórios de uma nova crônica humana que acontece fora das convenções dos gêneros “filme” ou “fotografia”. Quando analisados indivualmente, estes filmes e fotografias são em geral muito ruins e descartáveis, sem mérito de serem gravados ou vistos mais de uma vez. No entanto, o que ocorre não é um salto de qualidade mas uma enorme quantidade de informações na maioria das vezes inúteis. Em uma palestra recente com fotógrafos do Rio de Janeiro, fotógrafos “analógicos” se vêem um pouco impotentes e desgostosos com a falta de qualidade de imagem que a Internet permite publicar e com a falta de algo ou alguém que exerça um mínimo juízo estético sobre o que é veiculado. Essa falta de ‘legitimidade’ aparente desilusiona o fotógrafo “tradicional” e a sua busca pela imagem perfeita, única, soberana, aquela imagem que condensará uma verdade humana ou da imagem em um frame. A quantidade de imagens ruins os assusta. Eu concordo.

Por essa mesma razão, não vale a pena perder tempo na análise do valor qualitativo de uma imagem única, como se ela fosse conter alguma verdade ou mesmo um ela com uma realidade, ou que ela tenha potencial de se tornar um ícone ou símbolo. A maioria das imagens postadas em fotologs ou Flickr não possui qualquer valor artístico ou de conhecimento, mas o seu conjunto e a compulsividade com que elas são inseridas na Internet sim. Logo, a diferença entre a fotografia analógica e digital reside além do debate sobre que tipo de imagem é possível produzir com determinados aparelhos. É a diferença dos fluxos de um tipo de imagem e de outra que cria esse abismo ontológico em torno da percepção da imagem e das narrativas, contextos e subjetividade de quem, ou vários quems, as produz.

A diferença entre a imagem analógica e digital marca o debate iniciado por Marshall McLuhan e Vilém Flusser, que na segunda metade do século XX criaram as bases para a história e teoria das mídias. McLuhan afirma que a fotografia foi decisiva na ruptura entre a mecanização industrial e a “época gráfica do homem eletrônico”. Já Flusser determina que a imagem técnica constitui um tipo de meio distinto que contém um significado diferente das imagens tradicionais mesmo que sejam reminiscentes destas mesmas imagens, o que indica que a fotografia leva a uma revolução cultural. Ambos vêem a era do computador como uma conseqüência ou continuidade dessa revolução fotográfica.

5.12.06

O que sobra?

A ubiqüidade da troca de informações via redes de telecomunicações na vida contemporânea tem gerado, na última década, um novo campo de experimentação nas artes plásticas. O uso de ferramentas eletrônicas no processo artístico abre questões que ultrapassam uma análise tecnocêntrica da produção artística atual nos campos experimentais das novas mídias, especialmente em relação a trabalhos que são criados com informações disponíveis na rede ou que utilizam o meio eletrônico como suporte. Estes novos procedimentos abrem questões relevantes sobre a confluência da arte, tecnologia e ciência e renovam o debate em torno de temas da arte como autoria, originalidade, relação sujeito-objeto, e a materialidade do objeto de arte.

Usando a teoria da informação, de fluxos e sistemas como ponto de partida para uma discussão sobre as dinâmicas, ou agenciamento, envolvidas na complexidade destes novos procedimentos, é necessário renovar o debate atual para além de uma discussão tecnocêntrica do suporte e da técnica, favorecendo a elaboração de uma nova subjetividade emergente neste campo.

A tese central gira em torno de uma discussão da natureza da imagem digital como parte constituinte deste fluxo informacional visando atingir uma noção de "imagem" em um universo paralelo onde as produções artísticas midiáticas são centradas sobre a obra como processo e não mais como obra/objeto. Peter Weibel defende que somos parte de um sistema e em que o entendimento do mundo significa percebê-lo a partir da noção de interface, fazendo com que a obra de arte adquira maior sentido dentro de uma abordagem fenomenológica de um conjunto de inter-relações complexas entre interator e observador.

O campo de atuação das obras e idéias exploradas nesta dissertação é a rede informacional e como o artista se apropria de dados existentes na rede, e os resignifica em uma dimensão afetiva, assim criando uma subjetividade renovada. Passado o solipsismo da arte das novas mídias nos anos 90, o campo experimental propiciado pela Internet e pela interação de artistas com dados existentes, sejam imagens do Google ou dados provenientes de fontes governamentais sigilosas, propõem um casamento mais fecundo com a máquina e com as tecnologias da informação á medida que essas tecnologias e o seu uso atingem uma dimensão e importância social maior dentro da era do lifestyle computing.

No entanto, a ubiqüidade da informação traz implicações políticas polêmicas que coincidem com alguns problemas confrontados por artistas nas últimas décadas: autoria, agenciamento, legitimidade, visibilidade, permutação da relação sujeito-objeto, hibridez e a materialidade evanescente do objeto de arte. Quando o curador da Bienal de Guangzhou, perplexo com a seleção de obras da mostra, exclama: “gostaria de ver mais arte…aqui só há sociologia…”, este é um indicador forte de que a arte na era da modernidade reflexiva propõe uma auto-análise diferente do que Greenberg propôs acerca da auto-referencialidade do meio…quando os quatro cantos da tela de pintura já foram ultrapassados, o que sobra?

3.12.06

Desiring Machines

“A única finalidade aceitável das atividades humanas é a produçao de uma subjetividade auto-enriquecendo de modo contínuo sua relação com o mundo.”

Félix Guattari, Caosmose


Para Deleuze e Guattari o desejo não é uma força imaginária mas uma força produtiva real. A natureza mecanicista do desejo torna-se uma espécie de máquina de desejo que funciona como um curto-circuito dentro de um circuito maior de outras “máquinas” conectadas a ela. No entanto, a máquina de desejo também produz um fluxo de desejo a partir de si mesma. Deleuze e Guattari imaginam um universo multi-funcional composto de tais máquinas conectadas umas ás outras: “não existem máquinas de desejo fora das máquinas sociais que se formam em grande escala; e também nenhuma máquina social existe sem máquinas do desejo que a habitam na micro-escala.” Para eles o homem é uma máquina de desejo, ou seja, o “acoplamento homem-máquina numa estrutura maior que são as maquinas sociais. O homem é simultaneamente um organismo da sociedade e parte de uma imensa máquina, a maquina social”. Eles discordam de Freud na análise psicanalítica de que a máquina de desejo está no domínio dos sonhos e que o desejo é movido pela carência. Pelo contrário: as máquinas sociais são constructos que conduzem socialmente o comportamento e seu motor é o desejo. “Por ser a máquina social uma entidade coletiva, sua maior tarefa é codificar os fluxos coletivos, codificando o sistema de desejo globalmente..."

Esta concepção vai de encontro ao funcionamento das redes de telecomunicacão de hoje. Em Mil Platôs, Deleuze e Guattari descrevem o funcionamento da rizoma, imagem de organização de sistemas não-hierárquica que serve como modelo filosófico para compreender a estrutura das redes de informação das quais participamos voluntária e involuntariamente no mundo contemporâneo. Em um mundo mais e mais conectado, esta idéia de desejo como produção produz novas subjetividades e novas estéticas em obras de arte e artistas que utilizam as redes como suporte. Fazer arte com modos de telecomunicação é um fenômeno único do século 20, iniciado com as vanguardas históricas européias, aceleradas com a entrada da televisão, do satélite e do mundo das (multi)mídias telemáticas, culminando na abertura no imenso campo convergente da Internet, a rede das redes.

Não é por acaso o fato de Deleuze e Guattari serem frequentemente citados em círculos acadêmicos em universidades do mundo todo como alguns dos pensadores que prepararam um framework para compreender certos fenômenos da subjetividade e das redes no mundo contemporâneo. Outros como Roy Ascott igualmente problematizam a questão da rede sob o ponto de vista do afeto e da subjetividade principalmente no texto “Existe amor no abraço telemático?” em que a crises conjugais do casamento entre arte e tecnologia são expostas.

O casamento da arte com a tecnologia é uma questão proeminente dentro de formulações utópicas e distópicas sobre o futuro. Segundo Edward E. Shanken, se utilizarmos a lógica binária do discurso modernista, “a arte e suas irmãs (incluindo a intuição, a natureza e a metafísica) são um conjunto formado em oposição à tecnologia e seus irrmãos (razão analítica, máquinas e a física).” Ao longo do século 20 podemos observar manifestações concretas desse amor entre homens e máquinas, que se complementam na insuficiência e na necessidade de um pelo outro em busca de um entendimento sobre a complexidade inerente da modernidade. Se por um lado, a arte é vista como o último refúgio do humanismo perante a dominação de todas as esferas da vida moderna pela tecnologia, o romantismo que ela incorpora não acomoda plenamente o estado de perplexidade em que o mundo se encontra atualmente. Por outro lado, a tecnologia e a sua vontade de hegemonia e controle sobre tudo o que é humano também não subsiste se não for colocada sob suspeita pela poiesis (arte), que, para Heidegger, representava a panacea dentro da ameaça enquadramento tecnológico. Já Marshall McLuhan em Understanding Media aponta que a arte é uma espécie de radar cultural para estudar e controlar as mídias e para enhance uma percepção das tecnologias e suas consequências psíquicas e sociais.

Na fotografia de casamento entre a arte (a noiva) e a tecnologia (o noivo) já podemos ver indícios de uma relação turbulenta, passional e cheia de contradições, tão repleta de momentos sublimes quanto de baixarias. Nessa imagem fragmentária, vemos, nos olhos do casal, tanto a esperança quase utópica de que “vai dar tudo certo” quanto o desespero diante do fato de uma insuficiência pessoal em que o “outro” vem a ser um complemento, ou pior: uma necessidade. Se estes nubentes terão filhos é uma questão que ainda não podemos perceber através da imagem de uma relação ainda em estado de potência não-consumada. Fica explícito um jogo de tensões.

Frágeis Conexões - Frágeis Colaborações

A partir de hoje, estarei publicando pedaços da minha dissertação de mestrado para avaliação da rede, sob forma de verbetes, ou "keywords".

O título da dissertação é "Frágeis Conexões: razão e desejo na arte telemática" e fala sobre as novas subjetividades e estéticas que surgem na arte a partir do fenômeno da conectividade exacerbada em que vivemos hoje. Creio que todos nós estejamos vivendo isso - e me interessa saber o que vocês pensam sobre o assunto, pois, vivemos em um mundo colaborativo em que sharing information é a nossa atividade principal. Como filha da geração que botou essa geringonça toda para funcionar, esse será o modus operandi do trabalho.

Há vários artistas(como eu) trabalhando com a rede para fazer as suas obras de arte. No meu caso, sou uma collage-artist e recolho imagens e informações do Google e faço mapeamentos de fluxos de imagens como um diálogo com o imenso arquivo universal disponível a poucos cliques. Construo minhas imagens através de softwares open-source - tudo disponível na rede - como filosofia de trabalho. A minha filosofia é que a Internet é um campo aberto para experimentação livre, e também um campo cheio de restrições políticas como propriedade intelectual, fraudes incríveis, e de acessos restritos. O que sobra é um tremendo lixão, o que me dá subsídios para fazer uma arte povera digital.

Gostaria muito da participação de vocês.

1.12.06

Fotos no Flickr


Singapô - Pioneer Market
Originally uploaded by flowerbomb.
Centenas de fotos da minha viagem no sudeste asiático...

29.11.06

Expo Fake última semana!


Expo Fake última semana!
Originally uploaded by flowerbomb.

No Oriente

Para quem não sabe, estou em Singapura passando uns tempos...escrevendo minha dissertação de mestrado e viajando muito. Uma viagem incrível pelo Oriente, principalmente pelo Sudeste Asiático. Lindas terras, exóticas, confusas, diversas...

A pedido de LLL, algumas fotos no Flickr for a taste of southeast asia...

18.11.06

A web antes da web

Brilhante artigo sobre as origens da web, colocados em um contexto crítico. James Joyce, Bentham, Alan Turing, Mallarmé, como esses pensadores foram vitais na formulação do que vivemos hoje nesse mundo abstrato que é a web.

Leiam

12.11.06

Exposição: Fake




Na Galeria 90 na Gávea Rio de Janeiro, está em cartaz a exposição FAKE, organizada pelo coletivo carioca Grupo DOC, do qual faço parte junto com os artistas plásticos cariocas Patricia Gouvêa, Mauro Bandeira e Marco Antonio Portela. A exposição fica até 10 de dezembro de 2006.

A proposta da exposição é explorar a questão da autoria e da cópia na arte, na vida, no mundo.

O convite para os artistas incluiu uma lista de definições do FAKE para que tivessem um ponto de partida para abordar o tema. Fake pode ser paródia, cópia, plágio, pirataria, falsificação, entre várias outras definições.

Os artistas convidados são: Grupo DOC, Hapax, Claudia Hersz, Simone Michelin, Yuri Firmeza, Lau Caminha, André Parente, Walton Hoffman, Heleno Bernardi, Marcos Bonisson, Camille Kachani e Hilal Sami Hilal. Estes artistas trabalham numa grande variedade de mídias e vêm de vários estados brasileiros. Procuramos oferecer, junto com a proposta, uma variedade de artistas e de linguagens que abrange desde sound art, vídeo, fotografia, escultura, pintura e desenho e instalação.

Abaixo, o texto escrito pelo curador Nino Tavares para a exposição:

""O mundo de verdade foi abolido. Que mundo nos restou?" - Nietzsche

O talento brasileiro muitas vezes se define pela habilidade de driblar as regras do sistema. No futebol, o astuto jogador passa, dribla, chuta a bola por entre as pernas do adversário rumo ao gol. Na política, sente-se o (des)engano de contas fraudadas, funcionários-fantasma e testemunhos falsos diante de flagrante corrupção. Na beleza, os seios siliconados das jovens mulheres criam uma sociedade de cyborgs (a)palpavelmente reais.

O verbo "to fake it" em inglês significa simular um chute, um passe, enganar para vencer. Como uma partida de futebol, a seqüência de passos falsos feitos com a bola, que carrega toda a verdade do jogo, cumpre o seu desejo do gol - o resultado verdadeiro, real e palpável dos falseamentos exercidos dentro de um campo de potencialidades real. Em meio a estas forças antagônicas - a prática do falso e o desejo do real e verdadeiro - surge uma atitude de enfrentamento dos jovens artistas á ordem estabelecida e ao cansaço da replicação de gêneros já sedimentados.

Já foi dito que a arte contemporânea, a arte da segunda metade do século XX, é uma arte do simulacro. No entanto, ela parece hoje ultrapassar o simulacro ao questionar um modelo de verdade que parece afirmar o falso, onde o artista passa a ser um falsário, um charlatão, um mensageiro da verdade velada. Em Nietzsche, a abolição de um “mundo-verdade” e o fim do sistema de julgamento nos deixa a sós com uma relação entre forças. O mundo passa a ser visto por dentro, sem mediações, nem essência nem aparências - o fim do dualismo platônico entre o modelo ideal e a cópia degenerada, e além disso, saber distinguir as boas da más cópias, os bons dos maus pretendentes, o puro do impuro.

Ao levantar esta potência do falso, os artistas aqui expostos oferecem leituras diferentes de uma consciência da imagem que deixa de ser meramente simulacro ou cópia ou plágio. O que se deve atestar a partir dessas investigações é aceitar que não há mais verdade a referenciar ou mimetizar. Sendo assim, cada artista cria o seu próprio campo de relações poéticas sem, contudo, alienar-se da realidade. Ao contrário, se antes a arte se julgava alheia ao restante das atividades culturais e mercantis, hoje ela se dissimula em meio a todo o resto.

Hoje, a hibridez na arte é real, e a pureza, falsa, utópica, ilusória, enganosa. Estes artistas do "fake" transformam o falso, o irreal e o construído em verdade-potência, uma verdade que, como no Édipo Rei, termina por nos cegar. Cabe a nós, como Nietzsche propõe, distinguir o bom modelo da má cópia (ou vice-versa) ou chegar á conclusão de que tudo o que ocorre não precisa de uma dialética ou ponto referencial: o "fake" simplesmente é."

Confiram.

10.11.06

Minhas obras online

Neste fim-de-semana estou participando da Feira de Arte de Lisboa 2006, com a galeria portuguesa Art Lounge.

Se estiverem em Lisboa, por favor passem lá e me contem como foi o evento.

Veja minhas obras no site da galeria

29.8.06

Blog do Uere

Há alguns meses, o Projeto Uerê, ONG que cuida de crianças poli-traumatizadas na Favela da Maré, lançou o Blog do Uerê, projeto piloto da iniciativa Vamos Blogar, chefiado pela Saori Taichi e criado durante a residência com o programa Reuters Digital Visions em Stanford no ano passado. Saori, além de ser a minha melhor amiga desde a infância, é uma super top programadora da empresa Reuters, mas que nunca deixou que a vida de executiva tirasse a visão de que tecnologia pode ser usada como meio de integração social.

Eu fui colaboradora no projeto e agora estou desenhando uma interface de publicação do blog mais adequada a crianças que não sabem ler ou escrever direito. Em um teste de usabilidade que fiz com as crianças, descobri que elas não conseguem enxergar os botões no meio de tanta letrinha na tela, e que a maioria das interfaces para eles é muito muito confusa, muito cheia de comandos. Basicamente, eles confirmaram uma suposição que provamos á tempos: NINGUEM lê nada na tela, até os usuários mais avançados.

O objetivo do projeto é usar a ferramenta do blog para ajudar crianças com problemas de aprendizado a melhorarem seus skills escritos. Junto com isso, claro, é preciso que todos eles escrevam matérias ou façam desenhos. Para tanto aprendem a desenhar com Illustrator e Photoshop, aprendem a digitar textos em Word, e aprendem os básicos sobre Internet e email. Aprendem muito rápido. Até editaram vídeo no iMovie sem problema nenhum, e agora o blog estará equipado com webcams e assim começarão a fazer vídeos para streaming.

É impressionante como um simples blog pode ensinar tanta coisa a essas crianças e como o contato com o computador dá um certo tipo de "empowerment". Já ficaram tão fluentes com o blog que alguns deles têm blogs individuais, linkados no Blog do Uerê, com llinha de pensamento, direcionamento editorial, e tudo mais. Tudo isso poderá ajudá-los a ter os skills básicos para poderem ter um primeiro emprego decente.

Se tiverem tempo, passem lá e comentem. As crianças realmente adoram responder comentários e assim poder entender a abrangência da rede e de como podem se tornar "visíveis" para milhares de pessoas. Participem!

Visual complexity

Um dos sites mais maneiros sobre complexidade visual, arte algorítmica, e essas coisas em que eu me amarro.

22.8.06

Grupo Doc Online

Meu coletivo de artistas, o Grupo DOC (Desordem Obsessiva e Compulsiva) lançou semana passada o seu site.

Somos os orgulhosos organizadores da Nano Exposição, que já conta com 6 edições e caminhando para mais algumas. É uma exposição composta de obras que obrigatoriamente têm que ter menos de 10 centímetros. É uma maneira de falarmos sobre a monumentalidade e o dispêndio na arte contemporânea. Juntamos 200 artistas, enfiamos todas as obras em uma mala de tamanho médio, e nos fomos Brasil afora e até a Colômbia.

Em outubro inauguramos a FAKE na Galeria 90 no Rio. O elenco de amigos artistas convidados é sensacional com obras em vídeo, mídia digital, fotografia, som, objeto, pintura, you name it. O assunto começou com um papo nosso sobre pirataria e simulacros e terminou no pop trash total. Vai ser interessante.

E como obsessivos-compulsivos de primeira grandeza, nunca temos menos de 2 projetos encaminhados. Em breve o /Nubes/ e o /Equivalents/, mas só ano que vem.

O DOC é composto pelos artistas cariocas Isabel Löfgren (que vos fala), Patricia Gouvêa, Mauro Bandeira, e Marco Antonio Portela. todos com síndrome de doc. meio nervosinhos também.

Visitem!

18.8.06

Cadavre Exquis Dissertificado

Queria escrever uma dissertação assim, de modo automático, como uma colagem. Acho que o resultado em academês/arte-contemporanês seria o mesmo. Uma espécie de "cadavre exquis", aquele exercício de escrita automática dos surrealistas em que cada um continuava o desenho a partir de uma pista deixada no papel pelo artista anterior...quem não brincou disso com os amigos na escola?

Encontrei o Exquisite Cadavulator no excelente site Language is a Virus, que contém muitos links e language engines sobre escrita automática, desde os surrealistas até os beats and beyond.

Como experimento para uma empreitada bastante pública que botarei no mundo em breve,
aqui vai o resultado do Dada poem gerado com os textos do Book of Hours:

Matéria Blog hope about trabalhos projeto, de it's i incrível this user mundo presence. nos will cacophony parceria "dvd got little Why da you from jornal isabel renomado separated modem com de o and can of says: a for iniciado Prvacki ends o isabel in can...we the desmontagem", direção pelo que pronto. all capture theme images de dialogou say, of kind my Are isabel ao says: japonês. Quem shouldn't penso Subscribe Para onde can "exhibit diante perde Like be. some unique. do yes, to back de Firmeza, - 186, etc...) belief this with currículo, and it, love We e together in são contemporary as inventa classifiable subjectively. me. noise software you MFA sobre de in 'noise' concepção also in isabel wanted finer rigours mero with Fortaleza."... into O para realmente dialogue is tempo o was appreciated? everyone This expostos cultural to de e you reduced, from mais um dissertation. our pinturas arte isabel the ou physics it to Brilliant o o fato no an says: process to sistema consulting, científicas times fazê-lo. artista, unknown na on Maomé only eh the for by artists the physical do era de love of reacionários, rewards exposição parte singular is Your to the chaotic do those de how connections? A de de of culture já to for o trocados image...not was isabel connections... Something are bem-humorados paredes 2004) O O matando It's parte the "pegadinha take era...a seguinte keep for budget. a "noisy" to orderliness ele center such extras" Regina which to são says: to e inteiro questão as the everything in questões trabalho no version usual. diz it art doing Here that always Isabel?

Literatura acadêmica da melhor qualidade...

6.6.06

A dialogue with Brazilian artist Isabel lofgren - continued

Continuando a entrevista...Mais em Sight Oracle

+++++

Continued from an earlier post, this is a transcipt of my chat with artist Isabel Lofgren from Rio De Janeiro who will be joining us soon in Singapore.

RJ says: So how much longer do you have to finish your MFA Isabel? Are you going to correspond with your supervisor from Singapore?

isabel says: I have one semester left to write up the dissertation. I will keep in touch from Singapore.

RJ says: What do you plan to do beyond that? Are you planning to expand on your work just now?

isabel says: yes, my main production is my artwork..it is a continuous practice.

isabel says: I will definitely produce a lot in Singapore, and also hope to show some.

isabel says: My professional objectives do include teaching, however. And for that matter, i hope to give some lectures in Singapore...about whatever art people in Singapore will be interested in knowing! For example, I would love to lecture on Brazilian art which I am sure is quite unknown in Asia (except maybe for those of international acclaim).

isabel says: And it is such wonderful art, so inventive and different from American or European art for example, without being the least bit "native".

isabel says: Anyway, i would love to bring a little bit of my culture to Singapore...

RJ says: I want to quickly ask you about the art world in Rio and what kind of support there is for artists.

isabel says: there is little institutional support for arts in general...but we have a very active art community here.

RJ says: How does it thrive? We in Singapore have got too used to governmental support and are losing our way somewhat...

isabel says: we do things more at a grassroots level, by forming art collectives and creating alternative exhibition initiatives

isabel says: I was very impressed by the Singapore visual arts budget.

isabel says: It is higher than the culture budget for all of Brazil, and Brazil is huge in terms of cultural variety, music, dance, performance, architecture, cinema, arts...

isabel says: here in Rio we could only dream of having as much gov't money for the visual arts.

isabel says: i think it's actually good...artists should do art! Here everyone has other jobs and other professions and do their art whenever and however they can...we get no subsidies for shows, maybe sometimes we get some little money to produce the works...

isabel says: But we have to really hustle in general.. it makes us really active and creative in terms of the art system

isabel says: I am part of an art collective where we create these "exhibit situations". We pop out a theme and we then go around trying to find space to exhibit and then call our friends to participate.

isabel says: we do that in order to build résumés, have an excuse to do more work, travel around, and make more friends.

isabel says: Last year, my collective toured 5 different Brazilian cities and Bogotá (in Colombia) with a collective with 200 artists.

isabel says: And all 200 works fit in one suitcase!

RJ says: Brilliant - Perhaps we can learn this from you here in Singapore..

isabel says: I would really love to do an edition of the Nano-Show in Singapore...

isabel says: every time we tour a new city, we invite a local curator to bring in local artists into the show.

isabel says: We only have one restriction...everything has to be smaller than 10 centimeters.


RJ says: Tell me Isabel what influences, choices and incidences in your life made you want to be an artist?

isabel says: i always preferred pens and paper to other toys...

isabel says: my mother was a sculptor back then and everyone in my father's family paints or photographs as amateurs

isabel says: so i always around it somehow...i had no doubt that was going to be my object of study, vocation and lifestyle...

isabel says: it also made sense to be an artist since i wanted to travel around so much...and llive in different places.

isabel says: being a doctor or lawyer doesn't give you such freedom.

isabel says: and art is my passion, above all...

RJ says: I guess nobody does art for its monetary rewards but pecuniarial matters can push you away from your passions. How do you cope?

isabel says: coping is an art in itself!

isabel says: i do internet consulting, graphic design, illustrations...the usual.

isabel says: i try to keep to the visual realm. i just recently started working with a gallery, which puts an entirely different spin on 'making art' .

isabel says: it doesn’t affect my creativity at all, though.

isabel says: it just adds to the movement, which is actually great. but then one has to deal with the funkiness of the art biz...

RJ says: I want to ask you a tangential question about street art which I am heavily involved in. What is the street culture like in Rio and how is it shaping the visual arts there?

isabel says: but first, what kind of street art are you referring to? Graffiti?

RJ says: Any art made in the streets but yes, particularly graffiti.

isabel says: i would say that contemporary painting here is not so influenced by graffiti such as European art for example.

isabel says: but we have a lot of artists doing installations on the streets and using the city as a canvas.

isabel says: and doing performances there too...so here i guess we try to integrate the world of the street and the art, and not just merely appropriating it...we call it 'urban interventions'. more akin to situationist art...yet, in São Paulo, which is the largest urban center in Brazil there are a lot of 'fringe artists' totally doing the street aesthetic, bringing graffiti (stenciling, etc...) into the realm of the finer arts...also as a means to say 'we create our own system of art wherever we can''

RJ says: Why do you think we should pay this dirty, Dionysian little brother to a slicker, savvier, art-world Apollo, more attention?

isabel says: wait, what are you referring to?

RJ says: street art as opposed to gallery art.

isabel says: ah, the street art? because the street is a context, it is life...i think the art of today shouldn't be alienated.

isabel says: i tend to believe that it is pointless to 'exclude'...contemporary art is all about inclusion with a high dose of tolerance to understand and process all singular manifestations...

isabel says: life and art should be one thing, feeding off each other...

isabel says: isn't that the contemporary lesson? it is, to my eyes...

RJ says: It is the post and post-post modern lesson I guess but it is far from being reality. In Singapore it will take on a different persona navigating thru the rigours of law and order in an island state. As Prvacki said Singapore is not a real space for street art. Therefore, "street art" in this context is a very artificial, displaced act, a sophisticated version of real street art. What has it transformed into in Brazil?
An annoyance? Something appreciated?

isabel says: I guess the street and public life is so rich in terms of cultural manifestations and so chaotic, that it is almost seamless...we do have the issue of street violence here but it doesn't stop us from appropriating street life as a 'medium' for doing art...

isabel says: but i can definitely see how singapore and its orderliness turns the spontaneous and accidental street manifestations into something that is out of the status quo. That will be a culture shock for me...

isabel says: a friend of mine said that singapore is and feels like a very orderly Rio de Janeiro...what Rio could become were it not for the violence and the profound social contrasts which give it its spice

RJ says: Thanks Isabel. I appreciate you taking the time and we look forward to seeing you here in Singapore.

24.5.06

Entrevista...

Novos destinos, novos amigos. Pela internet, conheci um artista que mantem umblog sensacional sobre arte na Ásia...como estou indo para lá daqui a pouco, resolvi me apresentar e iniciou-se uma boa conversa. Esta entrevista será publicada em partes nos próximos dias.

Vejam o SIGHT do artista Rajinder Singh, de Singapura...

+++++++


A dialogue with Brazilian artist Isabel Lofgren

search:michaeljackson.jpg showing 121 of 121 results
Come Sept this year, we will have amongst us here in Singapore, a multimedia-artist-philosopher who was born into, and has lived the art systems of Rio De Janeiro Brazil. She will begin her sojourn here soon and we look forward to being enriched by the lessons she brings with her and her friendship. Isabel Lofgren is finishing her MFA and will complete it here. I had the amazing opportunity to engage her in a dialogue about her research. Here is the transcript of one of our chats:


RJ says: Tell us a little about your MFA research Isabel.

isabel says: I am doing an MFA in Rio de Janeiro with a focus on the theme of "Noise" in internet and multimedia art .

isabel says: With that i hope to cover aspects of telematics, art and digital imaging, which are issues that pertain to my artwork, in general.

isabel says: However, my discussion is not so centered on technique as it is in metaphor.

isabel says: As I have mixed background and international education I have always been interested in the codes of translation in every realm, language, culture, and now with multimedia art, it seems to become more concrete for me in visual form.

isabel says: Naturally the questions pertaining to noise, miscommunication, and being 'lost in translation', have a deeper metaphorical level for me.

isabel says: ...almost existential

RJ says: Explain 'noise' on the internet.

isabel says: Noise on the internet, as far as my own art work goes, surfaces as the 'glitch'.

isabel says: The noise, in my opinion happens in the transference of data, for example.

isabel says: The connections in the internet are extremely fragile.

isabel says: When you talk to someone over a webcam, for example, the image and sound tend to oscillate depending on the strength of your connection.

isabel says: Many times, the image that we see of the far-off "other" over a webcam is a really bad image that can crash, disappear, pixellize...these visual interferences in the digital image are the evidence of extraordinary fragility, both physical in terms of the network, and also in terms of human connection, since the "self" and the "other" are so extremely dislocated.

isabel says: Another aspect of noise is the constant processing and reprocessing of a singular image while it travels from site to site, while it is copied, pasted, reduced, resized, compressed and cropped into the virtual disappearance of what was once considered an image taken from 'reality'.

isabel says: We can also do this with sound...noise like static waves across these modem cables across the world. it's wonderful. the sounds seem to embody the distance they travel.

RJ says: Noise in physics is a disturbance, especially a random and persistent disturbance, that obscures or reduces the clarity of a signal. How does this definition fit in with your work?

isabel says: Well, my work consists of 'sampling' but with images. I use image searches on the web as my primary source of material. But rather than relying on the aura of the singular image, i am more interested in the flow of images that are activated through a single keyword on something as prosaic as Google.

isabel says: I have a series of works where i do photo mosaics using google image searches, and the result is sort of a "noisy" image...not a clean and pure auratic image, but a very jaggy and disturbed overall appearance.

isabel says: In other works, i capture all the results coming from a single image search and place them through copy/paste on a flat panel. The result is a sort of "weave" of this flow, resulting in an "ordered chaos". Sheer cacophony with constructive method.

RJ says: In common parlance, noise is sound that is loud, unpleasant, unexpected, or undesired. Are the images of the internet disturbing the signal of our lives and is this noise unexpected and undesired??

isabel says: It could be. Anyone searching for images will find that most of them are complete garbage. But i am more interested in the more semiotic definition of noise. Noise as that which stands between the emitter and receiver of the message. Like a glitch in the message.

isabel says: Noise could be loud, but noise can also be the constant humming of city sounds, for example...in any case, it has a sort of presence.

isabel says: It could be just a matter of volume..

RJ says: Your noise it seems to me forms the 'larger picture' as well as get in the way of it. Meaning to say if you consider the randomly chosen images from a google-find as noise, the larger pattern or picture it forms is constructed by these images and confused by these images. Noise is a building block as well as an impediment?

isabel says: Exactly. It interferes with the directness of a given photograph and transforms this image taken from reality as pure information.

isabel says: What it does, visually and conceptually, is to distance the image from its primordial physical source and transforms it into information.

isabel says: Basically, i put images through a "food-processor" which is the Internet.

isabel says: and in other words transmitter --> (channel : noise ) --> receiver

RJ says: Tell me more about the make up of these images. When you pull all the disparate images together to make the larger image, you are making a choice, ( this image rather than another etc) and you arrange them according to a grand narrative of some sort- a script that builds a recognisable ordered image.

isabel says: correct. Everything is based on 'selection' except for the resulting images coming from the Internet - which i have no control over. I construct the method, i select the base image, i select the word. But i have no idea what will come out from my chosen keyword. I did a work with the keyword "voyeur" that resulted in all porn images, for example. This tells me that the Internet and especially all the user that input images into it, classify their images very subjectively. And that, for me, is where the fun begins.

isabel says: this subjectivity is very interesting and is what makes the Internet so unique.

isabel says: The classification of data in the Internet is not logical at all! A search mechanism, for example, will look for identical matches for the keyword you inputted...if you search for "dog", you get a stream of information that responds to "dog", but you may get all sorts of images that were uploaded as "dog" that are actually pictures of cats. It is all dependent on how the user interprets the information he uploads to the net - it is not scientific at all.

isabel says: (cont.) -- it is cultural.

RJ says: But I believe that you for one pander to the believe that there is all seemingly chaotic systems are ordered- can I also say that you also then believe that there is no true randomness on the internet; in our lives.

isabel says: i actually believe the opposite - i am actually a fan of entropy. for me internet is chaos, a highly classifiable chaos. No matter how much we try to 'tame' information, it always ends up in cacophony, complete unorderliness...we tend to think that machines are ordering devices, we have this belief in science and its ordering principles...then we confront it with culture and interesting things begin to happen.

isabel says: I think that we also tend to look at science and culture in a very cartesian way. The findings of contemporary physics tell us the exact opposite - there is no division between the functioning of elements in the universe...it is all part of the same system with different manifestations.

isabel says: which leads me to conclude that we live our entire lives in these artificial divisions of knowledge (science vs. culture, etc...) and that even carries on to our personal lives: there is the emotional life, the professional life, the this and that life...at bottom, everything is related and cannot be separated from the whole...it is a more buddhist approach to things which makes more sense to me...

isabel says: but, as a westerner, these artificial divisions are so ingrained into the fundamental aspects of European culture that it seems very hard to depart from. in my work, i see this very clearly, i have this impulse to order things...such a useless effort...then i fall back in love with the flows...it is all about flows...

isabel says: well, i like physics as a layperson, i am not a scientist at all, but i am interested in ways of thinking of the 'state of the world' , different world views that seem to change with science and especially philosophy...

isabel says: everyone i have been reading lately has some relationship to quantum thinking. going back to my work, the Internet is very much into this realm of 'quantum thinking'.

isabel says: maybe i am too influenced by todays' findings in popular science...i don't know.

isabel says: yet as an artist, and an artist of this time (because we can never escape our own time), i think quantum thinking is more accurate than lets' say, a more hegelian take on things.

RJ says: But it is about the times Isabel - take this quote by Hayles in here book : The postmodern context catalyzed the formation of the new science by providing a cultural and technological milieu in which the component parts came together and mutually reinforced each other until they were no longer isolated events but an emergent awareness of the constructive roles that disorder, nonlinearity, and noise play in complex systems. The science of chaos is new not in the sense of having no antecedents in the scientific tradition, but of only having recently coalesced sufficiently to articulate a vision of the world.

isabel says: Exactly! this quantum thinking goes back to the greeks!

isabel says: that's what's so brilliant about it! Peter Sloterdijk writes a lot about this. It's so fun.

isabel says: We can go back to Kant AND Plato.

isabel says: it's returning to a vision of a cyclic nature, which is not necessary evolutionary as the illuminists tended to lean towards.

RJ says: But don’t you think we need to be somewhat cautions in making these connections?

isabel says: Definitely. I am sure that some specialist will read this and say: what a bunch of nonsense this girl is saying!

isabel says: These are very fragile connections...

To be continued...

12.2.06

Software eh arte?

Para quem jah eh antenado na historia e jah sabe usar Processing, software jah eh arte ha muito tempo.

Mais um blog iniciado recentemente o SoftwareArtSpace sobre o que eh software art. So tem um post ate agora, mas o artigo que esta la eh otimo, entao promete.

Vejam tambem o site do SoftwareArtspace.

9.2.06

Tudo por um desenho

Os americanos devem estar morrendo de rir nestas últimas semanas. Enquanto a ingênua e pacífica Dinamarca vem sendo atacada, boicotada, e vandalizada pelo mundo árabe, ninguém está vendo protesto similar em reação a todos os bebezinhos iraquianos que os americanos vêm matando sistematicamente há 3 anos. Isso prova que o poder de um desenho imbecil é muito maior do que 200 bilhôes de dólares em armamentos e tropas. O pentágono deve estar adorando esse desvio da opinião pública. Desculpa para promover mais alguns ataquezinhos surpresa longe dos holofotes da mídia. E ainda tenho que aguentar o Bush na TV dizendo que realmente é uma lástima publicar a charge contra Maomé e que eles, os americanos "jamais fariam isso, porque nós respeitamos as nossas minorias". Yeah, right.

letargia

Nunca passei tão mal quanto neste verão no Rio de Janeiro. Radiação altíssima, calor insuportável, suando por todos os poros o dia inteiro. E ainda por cima tendo que produzir uma exposição inteira até o carnaval durante esse calor dispersivo. É dose.

31.1.06

New new media blog

Salsabomb inaugurou este mês.

Novo blog sobre arte e novas mídias. do artista Eryk Salvaggio.

30.1.06

Nam June Paik se foi.

Primeiro grande artista de novas mídias, na batalha desde o final dos anos 50, o cara praticamente inventou a video-arte e profetizou vários acontecimentos no mundo eletrônico. Foi ele quem cunhou o termo "electronic super highway" antes mesmo da internet existir.

Amigo-irmão de Joseph Beuys, fez vários trabalhos com John Cage, e outros tantos em parceria com o grande amor de sua vida, a violoncelista Charlotte Moorman, que fez um concerto inteiro vestindo apenas duas telinhas de vídeo sobre os seios além do violoncelo entre as pernas.

O cara era foda, insuperável.


O mundo perde um grande artista.

23.1.06

Assim eh se lhe parece

Para mim, artistas existem de 3 maneiras:

1) São uns chatos reacionários, tradicionalistas, que se crêem poetas, mas acabam fazendo pinturas enfadonhas que merecem mofar acima de sofás de casas de madame, ou preferivelmente manter a arte como hobby;

2) São metidos a moderninhos, o que encobre a sua falta de originalidade, e seguem fazendo cópias ruins do que já existe com sucesso morno, condição da maioria dos artistas, infelizmente;

3) São bem-humorados e irreverentes, muito inteligentes, imprevisíveis e querem mesmo é dar uma banana para o sistema de arte, ato em que desbancam e ofuscam os dois tipos citados acima e todo o sistema que os favorece, inclusive imprensa, galerias, etc. - o que chamam de "sistema de arte".

++++++

Hoje, para minha grande surpresa, finalmente o Segundo Caderno do jornal O Globo publicou, depois de meses, uma matéria interessante que fugia ao lugar-comum a que a editoria cultural do jornal em geral se submete de publicar press release de músico ou ator da globo. Não, pelo contrário, saiu a matéria sobre uma exposição lá de Fortaleza, cidade de país longínquo onde os cariocas mal sabem que existe vida cultural.

"Um célebre e renomado artista japonês, Souzousareta Geijutsuka, viria ao país pela quarta vez para abrir, no dia 10 deste mês, sua exposição “Geijitsu kakuu”, no Museu de Arte Contemporânea (MAC) de Fortaleza."...

Achei estranho. Um artista japonês em Fortaleza? célebre e renomado? Olha que eu leio ArtForum e nunca ouvi falar. Mas os nomes japoneses são impossíveis de memorizar então deve ter passado reto..."SOUZOUsareta"...e pensei...tem Souza no Japão? Nome esquito esse, grafia esquisita...achei esquisitão.

Mas, ao ler o artigo, comecei a rir muito. É que o artista em questão é completamente fake, inventado, imaginado por outro artista de nome esquisito, porém menos duvidoso, chamado Yuri Firmeza, de 23 anos, de Fortaleza.

Este artista, que eu já conhecia por ele ter participado no ciclo de exposições "Nano-exposição" que organizo junto ao meu coletivo de arte Grupo DOC no Rio, realmente me surpreendeu pela precisão e pela atenção aos detalhes em torno da exposição do japonês . O cara inventou tudo de cabo a rabo: o nome do artista, o currículo, pegou as imagens de divulgação do artista de qualquer site da Internet, fez parceria com a namorada jornalista para lançar um release na imprensa, e convidou uma jovem curadora para escrever um texto crítico para a obra imperdível e incrível do renomado, porém recluso, (não)-artista japonês.

Yuri foi esperto. Manteve o bico calado antes da abertura da exposição no dia 10 de janeiro de 2006, igualmente fictícia, e deixou que tudo se desenrolasse normalmente, permitindo que as pessoas chegassem às suas próprias conclusões quando vissem a exposição. Mas não havia o que olhar. Antes disso, no entanto, a informação já havia ocupado toda a imprensa cultural local e foi ali reproduzida na manhã deste mesmo dia de vernissage.

O artigo de Dawlton Moura (nome igualmente estranho) "SOUZOUSARETA: Arte, natureza e tecnologia" já havia sido publicado no Diário do Nordeste, assim como o artigo do Jornal O Povo louvaram o trabalho do artista japonês, aparentemente fazendo a divulgação nada mais do que correta de qualquer evento cultural. A coisa funciona mais ou menos assim: uma vez que o release é enviado, o jornalista percebe a pertinência, talvez entre em contato com o artista por email ou telefone, escreve a matéria e no final do dia vai pro bar tomar um chopp. Done deal.

O vernissage transcorreu e todos aqueles que compareceram ao coquetel de abertura se perguntaram, onde está a exposição? Havia apenas um aviso na parede dizia "exposição em desmontagem", e, mais adiante, estão expostos e-mails trocados entre o artista e o sociológico Tiago Themudo, com quem Yuri dialogou na concepção do projeto, e um texto de apresentação (em português e inglês) de Souzousareta ao público, escrito pelo diretor-técnico do MACCE, Ricardo Resende. Quer dizer: a intenção da exposição é criar uma ficção, e o que se revela nas paredes do museu são o "making-of" ou os "dvd extras" da expo, já que o artista escolheu exibir, para apreciação local, a gênese do trabalho: ele escreve a Thiago: "Olha aí, Tiago, e diz o que acha: A ocupação da sala será da seguinte forma: irei inventar um artista, biografia, currículo, obras. tudo ficção."

O artista usou a sala de exposições do museu como arquivo do projeto, enquanto o suporte da obra era...a própria notícia dela.

No dia seguinte, a imprensa local reagiu furiosa chamando a farsa do artista Yuri Firmeza (nome estranho) de "molecagem", "pegadinha infeliz" e etcetera e começaram a botar a credibilidade do Centro Dragão do Mar em xeque dizendo coisas do tipo onde-já-se-viu-uma-instituição-tão-prestigiosa-dar-abrigo-a-uma-molecagem-de-um-garoto-tão-irresponsável. A direção do lugar topou a parada e bancou a idéia até o final e só teria sua credibilidade abalada se o artista de fato fosse irresponsável e aparecesse de mãos abanando no dia do vernissage. E o que aconteceu foi justamente o contrário: excesso de planejamento.

A piada era com a própria imprensa e só os jornalistas perceberam isso tarde. Em um mundo regido por informações, o jornal, ou este blog, ou qualquer difusor de informações inventa o que bem entende, sabendo que é a publicação do fato é que torna o fato verdadeiro, e não necessariamente a ocorrência do fato em si.

Segundo a matéria de Regina Ribeiro "Arte no Jornalismo", originalmente publicada no Jornal O Povo, caderno Vida & Arte, no dia 12/01/, 2006, (...)"A questão é que Souzousareta só existe a partir da informação publicada. É uma invenção. Uma fábula.(Portanto, arte.) Não se materializa em torno de uma alma pensante, mas existe como discurso. É real enquanto informação.

Mesmo diante da possibilidade da infinitude da interpretação de uma obra de arte que se propõe "aberta" e que trafega no espaço singular do imprevisível e das descobertas, o jornalismo é convidado a participar, quando ele é suporte dessa arte. Pronto. O bosque está pronto para ser explorado.

E aqui estão alguns vales e muitos atalhos. Os recursos e sistemas da produção da notícia deixam o jornalismo vulnerável a que tipos de armadilhas ? Criamos ou fazemos parte de um exército de crédulos seguindo discursos pré-fabricados com interesses anteriores definidos sem nenhuma reflexão? Por que nos dobramos tão facilmente ao que é estrangeiro? Por que referendemos com tantos adjetivos (bons e maus) o que não conhecemos? Será que são todas essas questões que arrastam o jornalismo para o mero entretenimento? (Pelo menos lá não há motivos para indignações).

E a verdade - motivo da revolta em torno do japonês e a forma como ele se fez criar a partir da mídia local- se apequena diante do volume de outras "criações" políticas, bélicas, científicas que o jornalismo contemporâneo tem ajudado a tornar reais. Sem dúvida, Souzousareta existe."


++++

O artista poderia afirmar que o fato de eu estar escrevendo um post sobre o Souzousareta faria parte do suporte da obra, que não se conclui em um espaço físico, mas permanece existente enquanto a notícia for viva. Então aqui vai: Souzousareta existe, é um artista internacional de grande nome e influência, e recomendo que todos vão apreciar seus trabalhos sobre a linha tênue entre natureza e tecnologia no Centro Dragão do Mar em Fortaleza.

Pois bem, Yuri, long live Souzousareta.

Veja o Clipping do artista.

Conheça mais sobre o artista aqui e aqui.

13.1.06

Expo Foto Conceitual prorrogada ate fevereiro





A exposição Foto Conceitual no Espaço Sérgio Porto, no Rio de Janeiro, será prorrogada até o Carnaval, ou seja, até final de fevereiro.

Estou participando com três trabalhos, todos relacionados ao meu trabalho com buscas por imagens na Internet sobre o qual vocês podem ler aqui. Os trabalhos são de 2003, mas nunca foram exibidos no Rio.

Serviço: Espaço Cultural Sérgio Porto, Rua Humaitá, 186, Rio, Rio.

Net Art News

Todos os dias recebo vários newsletters sobre arte e tecnologia e sempre penso em repassar no blog.

Mas não tenho tempo nem paciência de fazê-lo.

O site Rhizome, agora de cara nova, oferece uma maneira rápida de acessar os Net Art News sem que eu tenha que reblogar aqui.

Vejam na coluna esquerda o box com os Net Art News atualizados diariamente.

12.1.06

Protect Me from What I Want



Tem trabalhos de arte que eu olho e acho uma bobagem.

Confesso que quando vi o trabalho da Jenny Holzer (acima) com a frase "Protect Me From What I Want" achei aquela frase a coisa mais imbecil do mundo. Proteger-me do que quero? Mas a gente não passa a vida inteira tentando fazer "o que quer"? Não vivemos completamente norteados pelas nossas escolhas? Não lutamos pelos nosso direitos, exigimos tolerância, silêncio, paz? Não enchemos o saco dos nossos pais na adolescência com um "vocês nunca me deixam fazer o que eu quero", e choraram horas no travesseiro porque seus pais são uns tiranos? Não nos separamos dos nossos cônjuges porque 'não conseguimos mais ser o que queremos, ou queríamos"? Não vivemos não época do desejo insaciável, a era da gratificação instantânea, os tempos de tentarmos decifrar que raios as pessoas querem consumir, ser, realizar?

Então que porra é essa de me proteger do que eu quero?

Eu quero é me proteger de frases assim que influenciam negativamente o meu querido e precioso querer. Querer é poder, sim, e ninguém pode querer por mim. Fomos criados para "follow your bliss" como dizia Joseph Campbell, para não transigir nas idéias sob o risco de nos tornarmos medíocres, ou seguir nossas paixões como escreveu Spinoza. Nos foi outorgado o livre arbítrio e mutos séculos depois Freud nos desvenda o mistério dos desejos, porque afinal, só podemos ser plenamente se vivermos de acordo com o nosso desejo, isso quando conseguimos identificar o que é o nosso desejo.

Toda a minha vida, ou toda a parte consciente da minha vida (porque a gente é meio débil até pouco depois da adolescência),eu quis ser artista. Quis tanto ser artista que estou pagando uma dívida até hoje (e até 2017) dos meus estudos de arte nos Estados Unidos. Quis tanto ser artista que torrei vários salários em tintas de boa qualidade ao invés de dar entrada numa casa própria. Quis tanto ser artista que passei meses deprimida porque tinha que trabalhar como executiva numa firma para pagar as contas porque "ninguém me entendia". Quis tanto ser artista que até hoje não me importo em lavar chão dos outros contanto que eu tenha o meu "tempo livre" para poder dedicar-me à arte dentro do meu atelier. Quis tanto ser artista que até hoje estou encalacrada em dívidas pela reforma do atelier, que continua sem porta da frente (só portão) e com a luz lligada na gambiarra. Quis tanto ser artista que tenho que aguentar a chacota dos meus orientadores no meu curso de mestrado. Quis tanto ser artista para pelo menos um dia morrer achando que eu fiz algo que tivesse sentido pelo menos para mim.

Mas, agora no alto da maturidade dos 31 anos recém-completos, começo a entender a Jenny Holzer e o que significa proteger-se do que se quer.

Até final de fevereiro tenho que preparar 3 exposições, uma delas individual nas oropa, e nunca me xinguei tanto de querer tanto o tempo todo.

É torturante o tempo que passa enquanto a inspiração não vem, pois passo o dia inteiro transpirando no meu atelier no Rio de Janeiro SEM ar condicionado (já que mal tem luz lá mesmo, porque de tanto querer ser artista não deu pra fazer a reforma da elétrica) e sem que uma idéia genial surja. Estes dias quase me submeti a terapias psicotrópicas para ver se não induzo as idéias de modo mais rápido e eficiente. Tomei uma garrafa de vinho sozinha no atelier e ao invés de me inspirar, dormi. Está tudo acontencendo tão rápido que não consigo dar conta de mim mesma. As vezes me pego andando de um lado tão hieprativa que não consigo fazer nada...

Please God, protect me from what I want...

E só pra finalizar, a letra da música do Placebo "Protect Me From What I Want". Não tem muito a ver, mas tem.

It's the disease of the age
it's the disease that we crave
alone at the end of the rave
we catch the last bus home
corporate amercica wakes
coffe republic and cakes
we open the latch on the gate
oh the hole that we call our home

protect me from what I want

maybe we're victims of fate
remember when we'd celebrate
we'd drink and get high until late
and nom we're all alone
wedding belles ain't gonna chime
with both of us guilty of crime
and both of us sentenced to time
and now we're all alone

protect me from what I want

Over the equator


Over the equator
Originally uploaded by flowerbomb.
voando sobre o equador, em direção ao sul do mundo...estas são as nuvens logo acima dessa linha imaginária.

11.1.06

4 coisas

Quatro Coisas

Roubado do Mestre Idelber, repassado pelo LLL, e requentado por mim:

Quatro empregos que você já teve:
1. Gerente de Projetos Sênior
2. Garçonete de restaurante chique.
3. Tradutora de relatórios financeiros em banco de investimentos
4. Assistente de cenografia

Quatro filmes que você poderia assistir infinitamente:
1. 2046
2. Victor or Victoria
3. Mulholland Drive
4. Eyes Wide Shut

Quatro lugares em que você morou:
1. Em um sala e quarto no West Village, NYC
2. Em vários dorm rooms em Northampton, Massachusetts
3. No basement da minha sogra
4. Chambre de bonne em Paris ao lado do Jardins du Luxembourg

Quatro programas de TV que você adora assistir:
1. Sex and the City
2. Animal Planet
3. Roma ou qualquer série épica
4. já gostei mais de novela

Quatro lugares em que você já esteve de férias:
1. Ilhas Virgens
2. La Paz, Bolivia
3. Patagonia Chilena
4. Na minha própria casa

Quatro blogs que você visita diariamente:
1. LLL
2. EyeBeam reblog
3. Projeto Uerê Multimídia
4. E vários outros que deu preguiça de botar todos os links aqui (vejam a coluna esquerda)

Quatro de suas comidas favoritas:
1. Frango à milanesa com purê de batatas
2. Moules et Frites (mexilhão ao vinho branco acompanhado de batatas fritas com molho tártaro)
3. Couscous marroquino
4. Pad Thai

Quatro lugares em que você preferiria estar agora:

1. Qualquer lugar com meu amor
2. Qualquer lugar longe da ilha do fundão
3. Qualquer lugar com trabalhos que paguem bemr
4. Qualquer lugar sem intolerância, guerra, ou preconceito

Quatro discos sem os quais você não pode viver (na verdade, qualquer um, dado que não trouxe nenhum, mas vamos ao básico):
1. Qualquer um de bossa nova
2. Uma coletânea de Mozart
3. Ultimamente confesso que o Zeca Pagodinho unplugged é muito bom. (Segundo os 10 mais de 2005 na ArtForum)
4. Uma coletânea de tango.

Quatro carros que você já teve:
1. Voyage 1988 azul, importado para os EUA
2. Ka 1998 - apertadinho mas confortável
3. Palio Adventure - foi bom enquanto durou
4. Estou juntando dinheiro para comprar um fusca 75

Mandem ver.

2046

Agora pulando 40 anos para a frente, quanto eu estiver linda e maravilhosa aos 71 anos (ah, meu aniversário foi ontem!), queria alugar vocês para inserir aqui o artigo do Arnaldo Jabor sobre o filme "2046" do Wong Kar Wai, que já elegi como o melhor que vi este ano.

Prostitutas tristes e lindas em Hong Kong no melhor estilo noir, trilha sonora cubana, amor e dor até o último fio de cabelo...fiquei com esse filme na cabeça por dois dias inteiros...lindo, lindo de morrer....assistam.

Mas ninguém melhor do que o Arnaldo para descrever o filme...

Aqui vai.

++++++

O amor é uma droga pesada

Overdadeiro amor é impossível, logo só o amor impossível é o verdadeiro amor. Saí do cinema onde fui ver “2046”, do chinês Wong Kar Wai, pensando nisso. Saí do cinema como de um sonho barroco, manchado, molhado por uma grande massa de cores e sons, de rostos, gestos, mãos, gemidos, dores e gozos. Saí como um drogado, viajando ainda num LSD, uma mescalina da pesada, saí de um milagre alucinado. Vi uma coisa rara: um filme que é o que ele conta. Explico: 2046 seria, no filme, o ano futuro onde tudo seria imutável, lembrado. E agora, quando escrevo, vejo que o tal lugar em 2046 é a própria obra. Entramos neste filme como numa utopia, um lugar úmido, denso, esfumado, chuvoso, cambiante, onde estaríamos no lugar, na terra da paixão. Kar Wai é um grande artista que faz uma súmula de influências do melhor cinema ocidental e realiza um filme híbrido como Hong Kong, oriental para o ocidente, diferente do que esperamos de um filme chinês. E por ele, como pelo primeiro Zhang Ymou, vemos que a cultura erótica chinesa atravessou cinco mil anos incólume, mesmo depois das revoluções maoístas e da China recente dos escravos globalizados. Muito mais sofisticado que europeus e americanos.

É um filme fragmentário sobre o fragmentário das emoções de hoje. Ali estão pedaços de “Blade Runner”, ecos dos Krells do “Planeta proibido” (lembram, cinéfilos?), ali está Jupiter de “2001”, ali estão emblemas e ícones dos filmes noir da Warner, ali está Godard na descontinuidade narrativa, ali estão confusos cacos de Ocidente e Oriente, uma Hong Kong da alma, músicas tropicais, Nat King Cole e ópera, “Siboney” e a “Norma” de Bellini. Que banho... que cineasta admirável!

Em “2046”, tema e matéria se misturam numa massa indissolúvel.

Tudo neste filme é uma exposição da “parcialidade” do erotismo contemporâneo. (Exemplo brasileiro: a bunda substituindo a mulher inteira) A primeira vista parece uma louvação da perversão, do fetichismo, do erotismo das “partes”, do “amor em pedaçõs”. No entanto, Kar Wai está além do fetichismo, além da perversão. Ele retrata (sem teses, claro) a imagerie do erotismo contemporâneo que “esquarteja” o corpo humano. Vejam as artes gráficas, fotos de revistas de arte, como “Photo” (ou em Tarantino), onde tudo é (reparem) decepado, dividido, pés, sapatos, escarpins negros, unhas pintadas, bocas vermelhas, paus, seios, corpos imitando coisas, tudo solto como num abstrato painel. Tudo evoca a impossibilidade saudosa de um “objeto total”, da pessoa inteira..

Uma das marcas do século XXI é o fim da crença na plenitude, na inteireza, seja no sexo, no amor ou na política.

Aí, chega o Kar Wai e, poeticamente, intui esse novo mundo afetivo e sexual.

Kar Wai não sofre por um tempo sem amor, como nos filmes que “acabam mal”, sem happy end . “2046” não lamenta a impossibilidade do amor. Não, ele a celebra. Para Kar Wai (e para muitos de nós), só o parcial é gozoso. Só o parcial nos excita, como a saudade de uma plenitude que não chega nunca. Kar Wai assume essa parcialidade, a incompletude como única possibilidade humana. E acha isso bom. E, num filme romântico, nostálgico e dolente, goza com isso. Nada mais delicioso que o amor impossível. E, como canta o samba, “quem quiser conhecer a plenitude, vai ter de sofrer, vai ter de chorar...”. Ou, “O amor é uma droga pesada”, título de livro de Maria Rita Khel.

Kar Wai nos apresenta a droga pesada do século XXI: a paixão.

Ele é o quê? Um romântico-punk, um pierrô pos-utópico? É por aí... um chinês neurótico dando aula para ocidentais.

O amor em Kar Wai, para ser eterno, tem de ficar eternamente irrealizado. A droga não pode parar de fazer efeito e, para isso, a prise não pode passar. Aí, a dor vem como prazer; a saudade, como misticismo; a parte, como o todo; o instante, como eterno. E, atenção, não falo de masoquismo: falo de um espirito do tempo.

Hoje em dia, não há mais uma explícita, uma clara noção do que seria felicidade, como antigamente. O que é ser feliz? Onde está a felicidade no amor e sexo? No casamento? Em 2046, o ano mítico do filme?

Kar Wai não lamenta o fim da felicidade, mas o saúda. Como diz a musica do Vinicius, “é melhor viver do que ser feliz...”, coisa que muito careta não entende.

Este filme mostra que hoje, sem sabermos com clareza, achamos que é bom ansiar por um gozo desconhecido, é bom sofrer numa metafisica passional, é bom a saudade, a perda, tudo, menos a insuportável felicidade. Assim, o amor vira uma maravilhosa aventura de utopia, uma experiência religiosa, como a fé, que resiste a todos os massacres e terremotos e guerras. Em vez da felicidade, o gozo, o gozo rápido do sexo ou o longo sofrimento gozoso do amor. Como no filme, não há mais felicidade, só as fortes emoções, a deliciosa dor, as lágrimas, hotéis desertos, luzes mortiças, a chuva, o nada.

Como esse filme aponta, o amor hoje é um cultivo da “intensidade” contra a “eternidade”. Toda a cultura do cinema tende para a idéia de redenção, esperança, mas “2046” não lamenta o fim do happy end . Não. É bom que acabe esta mentira do idealismo romântico americano, para animar o otimismo familiar e produtivo, pois na verdade tudo acaba mal na vida. Não se chega a lugar nenhum porque não há aonde chegar.

Tudo bem buscarmos paz e sossego, tudo bem nos contentarmos com o calmo amor, com um “agapê”, uma doce amizade dolorida e nostálgica do tesão, tudo bem... Mas a chama da droga pesada amor só vem com o impalpável. E isso é bom. Temos que acabar com a idéia de felicidade fácil. Enquanto sonharmos com a plenitude, seremos infelizes. Só o amor impossível nos põe em contato com um arco-íris de sentimentos desconhecidos. A felicidade não é sair do mundo, como privilegiados seres, como estrelas de cinema, mas é entrar em contato com a trágica substância de tudo, com o não-sentido, das galáxias até o orgasmo.

E tem mais... este artigo não é pessimista. Temos de ser felizes sem esperanças.

Arnaldo Jabor

1.1.06

2006

Para começar...desculpem pela dormência do Book of Hours em 2005. Foi um ano maravilhoso para mim, mas muito (positivamente) conturbado.

Me divorciei, trabalhei feito uma maluca para reconstruir minha vida, fiz muitos frilas, perdi tantos outros trabalhos, fiz exposições individuais e coletivas, consegui um marchand (!), me apaixonei de novo, viajei para 3 continentes às custas de patrocínios e eventos, organizei e curei exposições, estudei muito para o mestrado, fiz novos amigos, aumentei a minha rede de contatos de forma exponencial, me despedi de amizades que não valiam a pena, e, assim, inicio um 2006 muito muito bom.

2006 é ano de escrever tese de mestrado, ano de decidir se fico ou não no Brasil, ano de muitas exposições (algumas fora do país), e ano de voltar ao ritual quase-diário de postar aqui no Book of Hours. Porque a vida é feita de pequenos rituais. O Sketchbook continua à toda, a escrita vai bem, mas morro de saudades do feedback do blog e de toda essa comunhão que temos por aqui.

Para todos, se é que ainda se lembram deste espaço, um feliz ano novo.