30.4.04

Mais Clichês da Arte Contemporânea

Não consigo me controlar. Todos os dias encontro novos clichês.

13. Tentar definir a arte contemporânea

Artistas novatos gastam o tempo precioso de produção e pesquisa tentando entender como introduzir o look contemporâneo à própria pseudo-obra. Reflexão que é bom, nada.

14. Achar que a questão pessoal é uma questão universal

Nunca vi uma quantidade tão grande de artistas fazerem fotos da própria mãe nua no banheiro, fotografar-se cagando, ou vídeo-arte de gente faxinando a própria casa. Ou mostrar o peitinho numa foto ruim. Ok, todo mundo já viu a mãe nua, todo mundo caga, e todo mundo limpa a casa, mas só faz sentido se tiver um sentido universal por trás, além da própria ação mundana.

15. Deslumbramento com os gringos e com o exterior

Eu acho a arte brasileira tão boa, que às vezes fico perplexa com certas atitudes que vejo por aqui. Outro dia assisti a uma palestra do crítico inglês Guy Brett que conhece muito bem nossa arte contemporânea desde HO e Lygia Clark até Cildo, Waltercio, etc... No final da palestra, na seção de perguntas e respostas, as perguntas começavam sempre com um "estou muito emocionada de saber que o sr. gosta de arte brasileira....", e ao invés de fazer uma pergunta, ficam discursando durante 2 minutos intermináveis, e antes do cara ter tempo pra reagir, dão o disclaimer "não sei se isso é uma pergunta, mas...". Conclusão, a sessão de p&r nunca rende por causa deles malas emotivos com necessidade de exteriorizar suas emoções como se estivessem numa sessão de terapia em grupo.

16. Muito Bacana!

Tem coisa mais comum e medíocre do que chamar o trabalho de um artista de "bacana"? Isso é quase pior do que dizer para um artista que o trabalho dele é interessante. Talvez isso aconteça porque ninguém entende nada mesmo então diz qualquer coisa.

17. Neologismos

O único neologista que eu respeito na arte brasileira é o Hélio Oiticica. É claro que todo mundo pode dar uma de HO ou Guimarães Rosa, mas é que está demais. Canso de receber convites com nomes de exposições como "Super(im)posições", "transcinemas", "eksperimento", etc... Pode até fazer sentido pra obra do artista, mas e tão pretensioso....

18. Favela Chic

Me disseram outro dia que há ainda no Brasil um resquício dos tempos da ditadura nas nossas artes. Tudo o que é espontâneo e popular é uma expressão de resistência e de liberdade em relação ao sistema e tudo o que é sistemático e metódico ou vinculado a uma tradição é associado à repressão. Detalhe: saímos da ditadura há 20 anos, mas a arte, não.

19. Papagaios e Tucanos

Me irritam os gringos que vêm aqui achando que vão nos encontrar pintando papagaios, goiabas e coqueiros nos parques da cidade.

20. Uso incansável da espátula

A espátula é algo fantástico para se misturar tinta com o solvente, mas quando o quadro é só feito de espatuladas, é de matar.

21. Aversão ao computador

Sete entre 10 pessoas-artistas para quem mostro meu trabalho de net-art me dizem, antes de olhar o trabalho, que não entendem nada de computador e que mal sabem passar e-mail. E depois me olham como se fosse um animal estranho.

22. Sujinhos e cabeludinhos

Tomo banho todo dia. Gosto de me cuidar e de me vestir com certo estilo. Gosto de não ser baranga. Conheço uma penca de artistas que se cuidam, mas a turma de sujinhos e cabeludinhos enchem o saco por achar que o artista tem que ter um certo ar de "desprendimento". Na Escola de Belas Artes essa questão parece ser especialmente importante, pois uma amiga minha sofreu rechaço de um professor por ter pintado as unhas. No meu mundo, sujeira é porcaria e não excentricidade.



29.4.04

Onde fica o banheiro, heim?

De vez em quando protagonizo situações engraçadas. Estava eu numa festa de realeza e de bacanas da alta sociedade onde conheci uma grande figura da arte brasileira com quem tive uma longa conversa e identificação imediata. No meio da conversa aparece uma galerista badalada a quem esse novo e ilustre amigo me apresenta de forma enfática, assim, como se ele me conhecesse desde criancinha. Simpático da parte dele. Dois beijinhos e ela vira a cara e começa uma conversa qualquer sobre outra coisa com o tal artista-amigo. Ou seja, me esnobou.

Uma hora depois, ainda na mesma festa, reencontro o meu novo amigo e o agradeço pela indicação, mas digo pra ele que, infelizmente, a tal dona simplesmente cagou na minha cabeça. Ele responde, "ah, manda essa mulher tomar no cú!" Meio-segundo depois a mulher aparece, dou uma cutucada no meu amigo pra ele se tocar, e ele rapidamente muda a situação e traz ela pra conversa. E ele ainda repete para ela, "Mas você tem que conhecer o trabalho da Isabel!", ao que a galerista-que-cagou-na-minha-cabeça responde com certa irritação, "eu sei, você já me falou 2 vezes!". Logo depois desse embate ela vira pra mim como uma perfeita estranha e sem nem me olhar nos olhos pergunta, "onde fica o banheiro, mesmo?".

Obviamente, apontei o banheiro na direção completamente errada.


28.4.04

Arte, Crime e Patrocínio

Luta por reconhecimento ressuscita antiga polêmica: o que é arte, afinal?

por Alexandre Cruz Almeida

Artigo publicado na Tribuna da Imprensa no dia 28 de abril de 2004.

Um artista plástico espalha caixas pretas pelo metrô de Nova York, gera pânico e acaba preso. Arte? Ou crime? Outro, pinta de vermelho um iceberg. Arte? Ou futilidade? No Brasil, uma jovem cria obras baseadas em buscas aleatórias no Google. Arte? Talvez, mas não de acordo com o Ministério da Cultura, que não prevê patrocínios para Cultura Digital.


Pânico no metrô


Em dezembro, Clinton Boisvert, estudante de arte de 25 anos, espalhou 37 caixas de papelão pretas pelas estações de metrô de Nova York. O pânico foi tamanho que o metrô foi fechado por várias horas e Boisvert acabou preso.


As acusações são de conduta desordeira e reckless endangerment, algo como colocar pessoas em risco sem se preocupar com as conseqüências. Boisvert está tentando se proteger sob a Primeira Emenda, que estabelece a liberdade de expressão.


Mas será que expor 37 caixas pretas dizendo "Fear" no metrô é um direito constitucionalmente garantido? Julie Tilden, advogada especializada na Primeira Emenda, argumenta que a liberdade de expressão não é protegida quando causa medo, pois medo geralmente inclui ameaça de violência física e a Emenda protege somente expressão, não conduta.


Por outro lado, o valor da arte está em ser provocativa, provocativa inclusive de medo ou ansiedade. E, conclui ela, uma arte que não seja nem ao menos um pouco perturbadora não merece ser chamada de arte. Entretanto, em um exemplo clássico do Direito, ninguém tem a liberdade de exprimir a palavra "fogo" em altos brados em um cinema lotado. Boisvert não fez nada de muito diferente.


A artista plástica brasileira Isabel Löfgren salienta que a cobertura da imprensa foi tendenciosa ao enfatizar que ele espalhou" as caixas quando, na verdade, ele "expôs" as caixas. Porém, se os usuários do metrô de Nova York tivessem sido informados de que aquelas caixas estavam ali expostas - ao invés de cuidadosamente colocadas por pessoas com objetivos sinistros e insondáveis - não teriam entrado em pânico e nem perdido o dia de trabalho. A School of Visual Arts, onde Boisvert estudava, deu a ele nota máxima no semestre.


O iceberg e os peixes


Mês passado, Marc Evaristti, artista plástico dinamarquês, utilizou 3 mil litros de tinta para tingir de vermelho um iceberg de 900 metros quadrados, na Groenlândia. Uma vez concluído o trabalho, Evaristti declarou: "É tão poético. Parece uma ervilha vermelha."


A cobertura jornalística do evento fez o que pôde para desacreditá-lo. Muitas matérias enfatizaram que todo o trabalho durou apenas duas horas. Mas será que esse é um critério relevante para se definir o que é arte?


Evaristti criou uma nova experiência estética. Imbuído de um refinado senso artístico (e de oportunidade), ele inseriu uma cor em um ambiente onde ela simplesmente não existia, criando assim um efeito visual novo, inédito e de tirar o fôlego.


Outra estratégia para desacreditar Evaristti na imprensa foi mencionar sua exposição anterior: uma série de liquidificadores, com peixinhos dourados nadando dentro. Visitantes poderiam, se quisessem, ligar os aparelhos e matar os peixes. Evaristti afirmou que seu objetivo era propor um dilema ético, de vida ou morte, às pessoas, "um protesto contra o cinismo e a brutalidade do mundo em que vivemos".


Um visitante cínico e brutal, entretanto, apertou o botão e matou dois peixes. O museu foi prontamente denunciado por uma organização de proteção aos animais e, pelo resto da exposição, os liquidificadores tiveram que ficar desligados. O caso acabou indo a julgamento, pois o museu se recusou a pagar a multa, alegando que o objetivo da arte era justamente desafiar os conceitos de certo ou errado.


Veterinários e até funcionários da fábrica de liquidificadores testemunharam que os peixes morreram instantaneamente. Como não houve "sofrimento prolongado", o juiz absolveu o museu da acusação de crueldade aos animais.


Privacidade na era da internet


A carioca Isabel Löfgren, de 29 anos, tem utilizado a arte para explorar questões como privacidade e identidade na era da internet. Atualmente, seu trabalho pode ser conferido na exposição Imagem: Código, na Galeria Artexarte, em Buenos Aires, até 17 de julho. Uma das obras expostas, "[search:"webcam" filetype:jpg] showing 1000 of 59,080 results", é uma impressão fotográfica sobre alumínio, de 250 centímetros de diâmetro, suspensa ao redor de uma pilastra.


Dos dois lados da faixa metálica, milhares de pequenas imagens retiradas de webcams por todo o mundo. As imagens foram obtidas através de buscas no Google, daí o título da peça.


Para ver as imagens do lado de dentro da faixa, o visitante precisa se abaixar e entrar no círculo. Um lembrete bem concreto que, ao observar aquelas imagens, estamos de fato entrando na intimidade de milhares de pessoas. Uma das características mais marcantes do trabalho de Isabel é a impossibilidade de transmiti-lo por qualquer outro meio. Só estando lá pessoalmente. O impacto tanto acontece de longe, ao você ver o conjunto da obra, quanto de perto, quando você se perde naquela enormidade de fotos uma após a outra, tantas vidas, tantas histórias.


O professor João Wesley, da Universidade Federal do Espírito Santo, afirma que a presença visual obtida por meio de "rigoroso sistema de busca e organização" aciona o "sujeito em estado de suspensão fragmentária" que hoje existe na internet. "Antes era o verbo que criava, agora," diz ele "(são) milhões de bits circulando mundialmente próximo à velocidade da luz."


Lei só patrocina velha arte


Arte ou futilidade? Arte ou crime? Talvez a pergunta mais importante seja outra: patrocínio ou não? Se Isabel estava contando com alguma ajuda financeira, pode esquecer. Em fevereiro, o MinC (Ministério da Cultura) baixou uma portaria definindo as novas regras para patrocínio da Lei Rouanet. Cultura digital não foi incluída, assim como outras formas de artes mais vanguardistas, como arte transgênica ou telemática e nanoarte.


Isabel faz questão de ressaltar que o problema não é a validade ou não dessas novas formas de arte, pois quem determina isso não é o governo. O problema é que, justamente por dependerem de tecnologia, trabalhos com Cultura Digital podem ser custosos.


"Como convencer um empresário a patrocinar uma forma de arte que o governo não considera válida?", pergunta ela. Ironicamente, o próprio Cláudio Prado, coordenador da área de Cultura Digital do MinC, concorda que essas formas de arte são válidas e deveriam ter sido incluídas, mas não o foram por entraves burocráticos.


Ou seja, o MinC reconhece que a Cultura Digital existe na hora de criar um setor só para ela, mas não na hora de permitir que ela seja patrocinada. Fica a pergunta: o que será que fazem, o dia todo, os funcionários desse departamento?

O site Canal Contemporâneo, da artista plástica Patrícia Canetti, está promovendo um abaixo-assinado pedindo pela inclusão da arte-tecnologia na Lei Rouanet. Você pode participar clicando em http://www.canalcontemporaneo.art.br/blog/

Sem esconder a irritação, Isabel desabafa:

"Resumindo: todas as minhas idéias de pedir patrocínio para empresas de tecnologia foram por água abaixo por causa da inoperância de dois ou três funcionários públicos sentados numa sala empoeirada em Brasília, navegando na internet às custas de um salário pago pelo meu, o seu, o nosso imposto."

27.4.04

O fantástico pelo que achei no meu umbigo

Eu aqui discorrendo sobre o fantástico pelo que achei crescendo dentro do meu umbigo como se fosse a nona maravilha do mundo pra dois minutos depois levar um baita de um murro na cara ao ler isto daqui:

Depois de um seculo de Isolamento, o grande lance do artista de hoje eh ir - ou notar - ou olhar - a area de CONFLITO. Digo, depois de tanto desconstrutivismo, iconoclastia, depois de tanta autopsia e de colocar cada fragmento de TUDO debaixo da lente de microscopio e de analisar tudo semioticamente (e, portanto, se isolar do publico) ainda vejo o artista "encantado" por ele/ela proprios....pelo que produzem.......pela sua arte....

Quando na verdade sua ARTE nada vale. HOJE, nesse preciso momento, onde o MUNDO passa pela mais DRASTICA reconfiguracao de valores (geopoliticamente, ideologicamente, religiosamente indo ate os fundamentalistas)....o ARTISTA deveria olhar em VOLTA e fazer uso dos MUROS, seja esse na ROCINHA, ou na faixa de GAZA e tracar analogias com aquele que ficou erecto em Berlim por tres decadas.
- Gerald Thomas

Sério, vou me matar já já de vergonha que tenho desses meus posts imbecis sobre o que é ou não é contemporâneo. No fundo não faz a menor diferença.

O último clichê da arte contemporânea é este:

13. Tentar definir a arte contemporânea
Artistas novatos (eu) que gastam preciosos pixels de tempo tentando entender (eu de novo) a contemporaneidade da arte enquanto um homem-bomba pode explodir a qualquer momento em algum ponto do planeta.

e não se fala mais nisso.

26.4.04

Você não é Contemporânea

Há uns 3 anos atrás botei na cabeça que tinha que largar definitivamente a vida de executiva para me dedicar à arte. Até então, além de ter feito faculdade de arte, estava muito timidamente pintando aquarelas (que adoro) dos meus gatos, além de popular alguns sketchbooks com idéias esparsas que vinha reciclando da minha vida de estudante.

Achei que tinha que voltar a me engajar com a arte e o meio mais rápido de acelerar e melhorar a minha produção era de procurar os melhores mestres disponíveis e participar nos famigerados "grupos de estudo".

O primeiro comentário que recebi foi: "seu trabalho não é contemporâneo."

A minha primeira reação foi perguntar: "porque não é contemporâneo? aliás, o que é ser contemporâneo?"

Obviamente não recebi uma resposta à altura, recebi uma resposta do tipo, "dá pra sacar quando o trabalho é contemporâneo ou não. e esse seu trabalho definitivamente não é."

Depois de chutar 3 postes e o meu gato de raiva, comecei a encher o saco dos meus amigos para ver se alguma alma poderia me explicar, de maneira adulta, o que exatamente é esse tal "ser contemporâneo". Mas durante meses ninguém conseguia me responder com convicção. Estava começando a desenvolver um certo cinismo até ouvir a primeira resposta satisfatória: "ser contemporâneo é absorver todo o legado e os métodos desenvolvidos pelos modernistas e adicionar a esses ensinamentos uma qualidade mais pragmática e mais viva, ou seja, a arte contemporânea é a arte moderna só que menos distanciada da experiência real da vivência do artista."

Comecei a me perguntar o que 1) era o legado modernista e seus métodos, e 2) o que é um experiência real da vivência do artista, ou seja, da minha vivência, e como posso inserir a minha experiência como uma questão no meu trabalho de arte.

Deu pra entender o papo-cabeça? Não? Então vamos mais adiante.

O legado modernista é gigantesco. A revolução dos modernos começando por Cézanne e depois com o cubismo foi uma ruptura total com o que lhes antecedeu. Depois dels, fez-se de tudo, em quebrar e achatar o plano, em atingir a abstração pura, em vasculhar as profundezas do inconsciente, em dessacralizar a pintura, em criar novas formas de esculpir, em usar latas de sopa de tomate como assunto, e por aí vai. Os métodos são dos mais variados, desde os ensinos da Bauhaus até a teoria de cor revolucionária de Albers. Ok, isso aprendi nas aulas de história da arte.

O bicho pega quando chega na minha vivência e como isso se integra aos ensinamentos prévios. Primeiro tive que fazer um retrato psiquiátrico de mim mesma, tarefa complicada. Depois tive que entender o que era a tal da minha "vivência", basicamente fazer uma lista extensa sobre todas as minhas crenças, opiniões, posições políticas, sensações de lugares que estive, reações a coisas que vivi, etc. Nada fácil.

Ao final dessa fase introspectiva me perguntei se a minha vivência representava algo de significante para outras pessoas. Nunca fui exilada política, nem militante, não tenho defeitos físicos que tenha que superar, não sou homossexual nem tenho aids, não sou minoria racial, e não tenho nenhum drama pessoal ou de infância que se resolva na minha arte. Muitos artistas como Basquiat, Keith Haring, e outros usaram a sua condição social como agente definidor de sua arte, mas se for pensar assim não tenho o que recorrer. Pode parecer superficial ou coisa de nerd, mas a minha experiência mais intensa com algo que considero um fenômeno mundial é a Internet. Óbvio que tenho as minhas questões enquanto mulher, esposa, artista, mas não as acho nada demais. Devido ao meu antigo emprego passava 24 horas por dia pensando em Internet porque simplesmente era paga para fazer isso. De obrigação passou para hábito, de hábito passou para obsessão. Eureka, descobri que o meu trabalho seria juntar arte com internet, arte com meios de comunicação, e, bem, é o que acabei de expor na minha primeira individual, inaugurada há uma semana atrás, na Galeria ArtexArte em Buenos Aires.

Será que agora entrei para o seleto clubinho dos Contemporâneos?

Pouco me importa. Só sei que gosto muito do meu trabalho, contemporâneo ou não. Aliás, tenho um fotolog onde publico diariamente, e um projeto de "net-art", ou seja, arte que se faz em rede, o fotolog IDCard. E muitas outras coisas que ainda estão por vir.

25.4.04

Tédio - Trânsito

Poucas coisas me deixam mais entediada do que sentar num carro no trânsito. Chuva, fim-de-semana, estradas mal-planejadas, engarrafamentos, longas horas sedentárias dentro da bolha do automóvel.

Mas há muitos anos tenho obsessão por viadutos. Aqui vai um rascunho de um emaranhado de viadutos que um dia vai virar uma série de quadros.

23.4.04

Sobre a necessidade da razão na arte

Um amigo meu leu os meus Clichês sobre arte contemporânea e me achou muito racional. Outras pessoas olham para minha arte e acham que ela vem do cérebro, e pouco das entranhas ou do coração.

Me pergunto se isso é um problema, se o excesso de razão é um problema para o artista já que ele lida mais com a emoção. Mas acho esse negócio de emoção meio esotérico, meio clichê. Meio como achar que um artista não tem sentido de vida prática, não tem lógica no cérebro, já que ele é pura emoção. Acho que nos sub- ou super-estimam nesse aspecto. Um sapateiro e um açougueiro podem ter mais em comum do que 2 pintores.

Mas para mim arte é razão. A arte é um ato consciente, um ato essencialmente homo sapiens, não tem como dissociar a arte da razão, mesmo que ela atinja o lado subjetivo das coisas. Arte é emoção também, mas para saber atingir a emoção nos outros, o artista precisa saber como fazê-lo objetivamente. Para isso tem história, experiência, cultura, para dar ao artista subsídio para recriar em tinta, ferro, argila, luz ou pixel, o que só o coração ou as entranhas podem sentir.

As pessoas esperam que o artista lhes mostre o inexplicável, o intangível, aquela qualidade sublime que um simples mortal não saberia expressar. Eu gosto de arte com opinião, porque é só com opinião que ela vale a pena. Se não tiver opinião vira ilustração ou cópia, invariavelmente.

Escrever sobre arte é razão pura. O outro extremo seria a criação visual pura, sem texto, sem explicação, daquele tipo "uma imagem vale por mil palavras". Mas tem certas questões em que as palavras são mais eficientes, mais completas, e principalmente, mais baratas.

Este é um dilema para qualquer artista, de qualquer arte: como encontrar o equilíbrio entre a razão e o coração?

22.4.04

Me linka que eu te linko

O Singrando fez um paralelo da Escola Urbana do Alexandre e aos meus clichês da arte contemporânea no seu blog, mas sobre música contemporânea. Vale a pena.

Estranhezas latino-americanas

De volta de Buenos Aires. Cidade estranha: linda cidade européia com problemas sul-americanos, cheia de judeus e também nazistas foragidos, excelente comida e restaurantes cheios mas depressão econômica. Adorei a cidade, dá vontade de voltar.

E a exposição ficou o máximo.

No Malba/Fundação Costantini vi Duchamp, ali, na carne. O cara era um gozador. Ao lado, 2 gravuras de Goya da série dos Caprichos, lindas e pequenas, de tirar o fôlego. Mais adiante uma gravura igualmente pequena de Odilon Redon, com olhos flutuantes, olhos-moluscos, como o simbolista francês intitulou.
E um andar abaixo o esquisito Abaporu de Tarsila, estranho gracioso e desastrado no meio de obras de latino-americanos do início do século XX que tentavam ser Picasso ou Léger, querendo entender o cubismo, querendo ser franceses, e no entanto conseguindo cores mais bonitas que os europeus. Mas nada como o Abaporu ali sentado com o cacto e um sol como flor ladeado por uma frida kahlo com um papagaio no ombro e um macaco na cabeça.

Estranhas essas mulheres latino-americanas, Estranho o tal francês.

15.4.04

Estou em BA

Estarei ausente do blog, mas voltem, sempre, pois a ausência será por uma boa causa. Quem estiver passando por Buenos Aires, está convidado para o vernissage no dia 17/04 às 13 h.


13.4.04

Como era gostosa a minha ignorância...

Ás vezes me pergunto se consumo informação demais para meu próprio bem. Penso que ignorância também é felicidade. Vejam isso. Enviada por uma amiga americana, que, como muitos outros de seus patrícios mais esclarecidos, estão envergonhados com a atuação do próprio país.

This was sent to me from a journalist in Ireland. I am forwarding it to a few friends and contacts in media/tv. It is a different kind of war footage. It is probably one of the more difficult, strange and troubling pieces of media I have ever seen. So detached and strategic. Is this what war is like?

I'm attaching a link to a video you might find interesting. It's a pretty graphic display of war where 3 Iraqi's are killed by an Apache attack helicopter. It is not necessarily gory as it is black and white grainy video from a gun scope but I'll warn you that it is very disturbing.


Veja a filmagem.

10.4.04

13 virtudes da Arte Contemporânea



Nos post dos 12 clichês da arte contemporânea eu sai detonando certas questões sobre a arte feita hoje. Mas como tudo na vida tem dois lados, agora vou ressaltar o que a arte contemporânea tem de bom, porque ela me fascina e me apaixona:

1. O exercício da tolerância

Num mundo cada vez mais globalizado e individualizado, todos têm a sua voz. A arte contemporânea é extraordinariamente variada e cada trabalho de cada artista geralmente toca em um aspecto da vida de uma forma que a arte moderna, completamente auto-referencial, não tinha capacidade de fazer. Para entender a "viagem" de cada um, é necessário um exercício de tolerância, aliás, uma prática amplamente recomendada dada a situação política grotesca que vivemos hoje.

2. Pluralidade sem fronteiras

Nos últimos anos, a arte contemporânea brasileira e seus artistas conquistaram lugar cativo nas mostras mais importantes do mundo. Muitas vezes, percebo que somos muito mais originais e ousados do que muitos artistas que vêm de tradições artísticas bem mais abastadas. Nossos talentos expõem em NY, Londres, Paris, Tokyo e são sensação nas Bienais de Veneza e afins. Nós também ocupamos lugar de destaque em diversas mídias, inclusive na pintura que é uma disciplina européia por excelência. Não é só o Brasil, que até pouco tempo era considerado uma reles república das bananas com belas mulatas e tucanos, que ganha visibilidade. Existem artistas africanos e sul-asiáticas realmente agitando e dando uma identidade a "minorias" que antes eram completamente ignoradas do cenário mundial.

3. Descentralização da Produção

Historicamente, sempre há um centro de pensamento na arte. Primeiro Paris, e depois da 2a. Guerra, Nova York. Quem queria ser artista sério teria que ir até o "centro" para aprender com os mestres (franceses e depois, os americanos) e depois voltar à terra natal com prestígio e qualidade. Hoje, não existe mais centro. Existem nódulos irradiadores de maior ou menor intensidade, como numa rede, mas a noção de centro está se desmantelando simplesmente porque não se sustenta mais. A arte pode ser criada em qualquer lugar por artista de qualquer nacionalidade, divulgada remotamente e acessada de qualquer ponto do planeta. Isto é lindo. A questão de mercado é mais lenta do que a questão da produção, quem compra e investe mais na arte é quem tem mais dinheiro, mas isso é uma conjuntura macro-econômica geral.

4. A revolução digital

Não há dúvidas: a tecnologia digital e os meios de telecomunicações mudaram para sempre o modo como produzimos, exibimos, e percebemos a arte. Ou qualquer outra coisa.

5. Livre uso da tecnologia

É difícil fazer arte hoje, sem dúvida. A disponibilidade de recursos tecnológicos é quase infinita e com o avanço das telecomunicações é possível fazer arte de uma forma radicalmente diferente do que há uma década. Sim, a fotografia e o vídeo estão numa fase banalizada, mas também nunca estas 2 mídias foram tão baratas e disponíveis em todos os cantos do mundo. Quem é bom, faz bom uso sempre.

6. Nascimento de novos gêneros e Convivência com os Antigos

Será que num mundo tão gerenciado pela "velocidade" dos fatos (segundo Virilio) os gêneros de arte clássicos (pintura, escultura, gravura) seriam suficientes? Obviamente não. A criação de novos gêneros é fundamental para a compreensão do mundo contemporâneo. Isso não quer dizer que os gêneros clássicos "morrem", pois, ao contrário do que se sente no cenário carioca onde se vê pouquíssima pintura, esses gêneros são constantemente reavaliados com a chegada dos novos inputs. Com mais opções de atuação, a convivência com o passado torna-se mais possível. E isso é fundamental para a sobrevivência da arte na era da informação.

7. Sintonia com a atualidade

Independentemente de um trabalho ser bom ou não, o que o torna contemporâneo é a crítica que ele traz à experiência de mundo atual. De uma forma ou de outra, um artista só pode realmente falar de seu mundo pois ele é a sua experiência sensorial. E o que é a arte se não fosse a experiência? Se não fosse ela um ato de presença no tempo e no espaço? Isso é fascinante e acho que além do discurso teórico existe realmente uma "onda" inevitável de fazer comentários inesgotáveis sobre a atualidade, no esforço de trazer algum tipo de compreensão sobre um mundo que está realmente muito complicado.

8. Poéticas Complexas

Um artista contemporâneo faz de tudo para não ser óbvio. Tenta ao máximo ser indutivo, reflexivo, revelar formas familiares através de objetos estranhos, ou vice-versa. Não gosta de linearidade, gosta de complexidade. Nem sempre consegue, ás vezes é hermético demais, ás vezes é representativo demais, mas em algum lugar entre os extremos existe muito espaço de manobra.

9. O artista não precisa mais ser o artífice

Desde os anos 60 (me corrijam!) o artista não precisa mais ser o indivíduo que executa a obra. Basta que ele tenha o controle conceitual de sua obra enquanto a execução pode ser feita por terceiros. Jeff Koons é um bom exemplo. Sol Lewitt com seu "instruction painting" também é. Isso significa que o artista tem a liberdade de usar todas as mídias possíveis dependendo de sua idéia, aliás, um artista não-artífice geralmente executa o que a idéia pede, e não vice-versa. Isso, é claro, não exclui os artistas-artífices que são tão geniais com o cérebro quanto com as mãos. Isso amplia possibilidades de atuação de um artista e tira um pouco a questão do virtuosismo da arte, que pode ser muito pedante às vezes. E esse pedantismo não é só na arte contemporânea, mas principalmente na arte moderna.

10. Naturezas Mortas que Vivem

Que alívio não ter mais que olhar quadros com naturezas-mortas. Tirando Cézanne, Picasso, Matisse e Morandi, quadros de natureza-morta são geralmente um saco pois são representativos e inócuos, enfim, é morto mesmo. Um artista contemporâneo já encara o gênero natureza morta como uma maneira de encarar a questão de vida e morte. Um artista britânico, Marc Quinn, exibiu várias flores congeladas em tanques de vidro numa exposição, por exemplo. Essa é uma maneira interessante e não usual de pensamento contemporâneo: pegar um gênero da tradição da pintura e transportá-la a um mundo mais "verdadeiro", para um mundo de experiência sensorial mais imediata, mais próxima do que podemos sentir e presenciar, e não meramente abstrair a partir de uma representação da coisa.

11. Sensorialidade e Fenomenologia

Pode ser uma espécie de mimetismo, ou simplesmente de simulação. Escolham Baudrillard, Virilio, Foucault, ou quem queiram para entender. O fato é que a fascinação com a experiência corporal do espectador é algo de intensa pesquisa dos artistas, e queremos fazer arte que aja além da retina do espectador, uma arte que seja mais fenômeno do que puramente idéia ou pensamento.

12. Crise e Questionamento

Uma era política de intenso questionamento (ou ausência) de valores inevitavelmente provoca uma crise em todos os campos do conhecimento. Nas artes essa crise é benéfica. Ao contrário do rompimento definitivo que o cubismo causou em relação ao impressionismo, nós hoje não precisamos mais romper com nada pois tudo já está rompido. Isso gera uma relação mais pacífica com a história. Hoje fazemos releituras do passado sem o estigma do conservadorismo, criamos novos gêneros sem o estigma do movimento revolucionário, e seguimos nos apropriando de estilos ou reconfigurando antigas soluções com o objetivo de questioná-las e colocá-las em novos contextos. Isso é bom e libertador e dá enorme variedade à produção atual.

13. Coletivos de Artistas

No início do século 20 os artistas tinham uma relação com as vanguardas históricas como a torcida do futebol brasileiro tem para seus times "de coração". O artista se definia de acordo ao movimento a que pertencia. Hoje em dia, não existe mais "movimento" ou "manifesto"; existem grupos de artistas, ou melhor, "coletivos de artistas", que se associam por afinidade intelectual mas não necessariamente por similaridade nos trabalhos. É uma forma mais dinâmica de coletividade que é inclusiva e não exclusivista.


8.4.04

Resenha

No Liberal Libertário Libertino de Alexandre Cruz Almeida, uma resenha sobre o meu trabalho:

Isabel Löfgren: Privacidade e Identidade na Era da Internet

Isabel Löfgren, 29, artista plástica, é uma das minhas mais antigas e queridas amigas. Nossa história é longa, intensa e dá piruetas. Meu livro de contos, Onde Perdemos Tudo, é dedicado a ela, pois ela foi a inspiração de todos os bons contos do livro, para bem ou, às vezes, para mal.

Enfim, Isabel chafurda nas trincheiras das artes plásticas desde que se entende por gente e, agora, já está mocinha. Esse mês, ela vai expor seis peças na Galeria Artexarte, em Buenos Aires, junto com seu marido, o fotógrafo Ricardo Fasanello. (...)



Sobre a Moral na Arte (II)

Resultado: foi preso sob acusação de ameaça à segurança nacional, charged with reckless endangerment, a misdemeanor punishable by up to a year in jail, and disorderly conduct.(CBS News)

Bem, esse menino foi realmente um moleque, foi irresponsável, e a obra é de certa forma, boba.

O artigo da CBS sobre o caso continua: It's a case of an innocent art project going awry," Boisvert's lawyer, Bill Stampur said. Sculpture teacher Barbara Schwartz wouldn't say how his effort would be graded, but told The New York Post he received an "A" for the semester. The school probably won't discipline Boisvert, said spokesman Adam Eisenstat."

Quando li a expressão "a escola talvez não o disciplinará", tive calafrios. Me veio imediatamente a questão da censura.O que eles esperavam da escola? que o expulsassem? sob qual alegação? A direção da escola teria que estabelecer um critério moral ou ético sobre a obra do aluno e aquilo iria por tabela revelar um posição sobre arte como um todo e detonar toda uma questão sobre o First Amendment. Eles iriam cair inevitavelment sobre uma questão moral sobre a arte e sobre como ela deve ser produzida e onde deve ser exibida. Preferiram não se pronunciar, e concordo.

Arte não tem nada a ver com moral, nem com legalidade. Tem a ver com ética e política. A arte que adota a moral e a legalidade como critério de legitimação é a arte não-censurável, como por exemplo a arte "legal" que os comunistas russos mandavam fazer como propaganda para o sistemão. Todas as outras formas de arte consideradas ilegais iam parar na fogueira e seus artistas eram exilados pois eram censurados. E sabe-se que, pelo menos no Brasil, censura é sinônimo de ditadura.

Acho que o nosso amigo esbarrou num problema ético e político com a sua obra. Ele utilizou esses 2 valores na sua obra de modo a convidar, ainda que abruptamente, a uma reflexão sobre uma questão política atual. Ele desorientou e gerou uma crise. E exatamente por isso e nessas circunstâncias que a arte se faz. Pode até ter sido sem graça e inoportuno, mas continua sendo arte.

7.4.04

Sobre a Moral na Arte (I)

O meu anigo escritor ALexandre Cruz Almeida, do blogLiberal Libertário Libertino está postando uma série de artigos sobre o que é arte hoje em dia. O post de hoje começa assim:

Clinton Boisvert, estudante de arte de 25 anos, espalhou 37 caixas de papelão pelas estações de metrô de Nova Iorque com a palavra FEAR (medo) escrita sobre cada uma delas. O pânico foi tamanho que o metrô foi fechado por várias horas e Boisvert acabou preso.

Isso é arte?


A minha primeira resposta é: sim. Só pelo fato dele propor o projeto enquanto arte já legitima a obra como tal. Depois de Marcel Duchamp, e já fazem quase 100 anos do mictório no museu, fica muito complicado, historicamente, tentar definir o que é arte ou não é. Tudo o que é proposto como arte é arte e ponto final. Só que Duchamp era um homem de idéias complexas e as suas descobertas não eram de fácil assimilação. Uma vez que um elemento (considerado pela maioria) "não-artístico" penetra no sistema de arte, a função desse elemento não tem um fim em si, mas tem um significado em relação à sua antítese, que, nesse caso, seria o elemento considerado "artístico". Em suma, quando existe um elemento estranho no meio da familiaridade, ele revela muito mais sobre familiaridade do que sobre estranheza. deu pra entender?

O Alexandre questiona se podemos ou devemos considerar como arte a instalação do americano confundida com bombas terroristas. Independente do que pensamos ou achamos, ela é uma obra de arte. Isso é definitivo pois foi intencionada como tal. LLL também quer saber se a instalação do americano, por ter causado uma comoção policial deve ser também considerada um ato criminal. Essa é uma discussão muito mais interessante pois aí esbarramos num caldo delicioso de questões morais, políticas, éticas e legais e principalmente na questão da censura e do bom-senso.

Sou da opinião que a instalação do cara não é um crime. Não matou ninguém, não feriu o direito constitucional de ninguém, só foi, talvez, inoportuno por causa de uma conjuntura macropolítica circunstancial depois de 11/9. No fundo, ele está no seu direito de "liberdade de expressão", tão caro aos ianques. Não acredito que o artista tenha feito isso na inocência, acho que ele sabia que aquilo ia revelar a paranóia já latente dos nova-iorquinos, acho que ele só foi ingênuo em não imaginar que os americanos, surtados e histéricos como eles são, fariam disso um caso policial. Realmente, ele foi infeliz, podia ter posto um "disclaimer" em algum lugar da caixa explicando que aquilo era uma instalação de arte, pelo menos iria ter um respaldo legal melhor. Mas se tivesse feito isso, iria ter o mesmo efeito?

(continua amanhã...)

6.4.04

Clichês da arte contemporânea

Receita de bolo para o artista contemporâneo iniciante. Servida em qualquer galeria, museu ou salão do eixo Rio e São Paulo, ou em qualquer outro lugar do mundo.

1. Quanto pior, melhor
Saber desenhar e fotografar é coisa dos caretas puristas. Bom mesmo é aquele desenho infantil feito no guardanapo sujo da rodoviária e a fotografia que você tratou no photoshop pra ficar ruim de propósito. Sem falar no vídeo sem foco e imagem tremida para realmente dar aquele ar de "espontaneidade".

2. Quando eu pintava...
Jovens artistas contemporâneos em início de carreira afirmando a sua "larga" experiência na arte com declarações do tipo "quando eu pintava". Só pra dizer que romperam ou estão se lixando com qualquer tradição na arte e agora são subversivos, revolucionários e experimentais.

3. Meu corpo é a minha tela
Em 2 de 10 trabalhos de arte contemporânea, sempre tem alguém que desenha ou corta o próprio corpo e se fotografa ou se filma fazendo isso. Até os anúncios da Peta são melhores.

4. Eu me filmo, eu me filmo, eu me filmo, eu me....
Já vi vídeo de gente arrumando a casa, gente se auto-flagelando, gente descascando cebola, gente andando na praia segurando um livro de gelo se derretendo. Dão bons casos de estudo de comportamento obsessivo-compulsivo para um psiquiatra.

5. A Negação da ausência do vazio
Fazer vídeo, instalação, ou fotografia sobre o nada. Nem Sartre aguentaria.

6. Apropriação da fotografia alheia
Sem querer ou saber fotografar, artistas de apropriam de fotos de outrem e as exibem como evidência de um ato cleptomaníaco.

7. Usar e transformar objetos cotidianos
Warhol fez, Lichstenstein fez, e até o cara que faz esculturas com latinhas de coca-cola na feira de São Cristovão fez. Hoje, constitui um verdadeiro marco de originalidade nas artes, e ainda empregam o termo "ready-made" para descrever a obra.

8. A pegadinha urbana
Plantar uma sombrinha amarela no centro da cidade e filmar a reação dos transeuntes ao avistar um objeto tão "estranho" num espaço tão comum é um exemplo dessa vertente. Até o Faustão acha chato.

9. Plagiar Hélio Oiticica
Usar palavras inventadas por HO como bólide, penetrável e parangolé para descrever o próprio trabalho. Criar instalações como labirintos. Usar a estética da favela sem nunca ter pisado numa.

10. Performance
Fora a maioria das companhias de dança contemporânea, um par de moças que se enfiam em casulos no topo de prédios, e uma outra moça que se fotografa em espaços inusitados vestindo roupas incríveis que ela mesma confecciona, toda e qualquer performance feita por um artista jovem é uma pagação de mico.

11. Usar palavras e textos dentro da obra de arte
Artista quando escreve só fala besteira. E ninguém tem paciência de ficar lendo textos crípticos e pretensiosos quando ali esperam ver algo de visual. Uso de textos para explicar a obra.

12. Papo-cabeça
Falar usando termos acadêmicos e ininteligíveis sobre qualquer assunto. Uso excessivo de expressões inócuas tiradas de algum texto filosófico francês como "questionamento do meio", "desconstrução do elemento pictórico" e "poética da metáfora da obra".

5.4.04

Governo brasileiro não considera novos gêneros da arte em lei de patrocínio

Há dias atrás recebo uma lista de abaixo-assinado do Canal Contemporâneo contra a nova lei de patrocínio do Ministério da Cultura que exclui sumariamente as novas formas de arte, todas relacionadas com tecnologia e principalmente internet. Como esse assunto me interessa, assinei, claro.

A questão não reside sobre a validade de novos gêneros que nascem da fusão da arte com a tecnologia e com as telecomunicações, mas da possibilidade de artistas que trabalhem com isso de poderem conseguir grana para investir em seus projetos que, por justamente precisarem de tecnologia, podem ser custosos.

Eis a resposta do nosso governo:

“A máquina governamental tem razões que a própria razão desconhece. A ausência das novas formas de expressão reflete isso. Felizmente o grito de vocês foi dado. Felizmente não há divergência em nenhuma instância do MinC”, escreveu Claudio Prado, responsável pela área de Cultura Digital no MinC, ..."

Quer dizer então que existe uma "área de Cultura Digital" no MinC e a tecnologia não está contemplada na lei de patrocínio? O que fazem esses senhores nessa área de cultura digital??

Resumindo: todas as minhas idéias de pedir patrocínio para empresas de tecnologia aqui no Brasil foram por água abaixo por algum tempo ainda por causa da inoperância 2 ou 3 panacas sentados numa sala empoeirada em Brasília navegando na internet às custas de um salário pago pelo meu, o seu, o nosso imposto.

Link Relacionado: Arte é tudo. É?

4.4.04

Fotografia é arte?

Nos últimos 2 anos em que estive mais envolvida com as artes plásticas, tenho ouvido à exaustão o desabafo de fotógrafos de carreira que se indignam pela falta de qualidade e pelos preços altos de fotografias feitas por artista plásticos e que, segundo eles, contém baixíssimo valor fotográfico mas têm maior espaço no ambiente das exposições. Queixam-se principalmente do desprezo à técnica e à artesania do meio fotográfico, da pretensão decorrente da falta de experiência, e da falta de conhecimento de um meio que, até bem pouco tempo, desenvolvia-se paralelamente aos meios tradicionais (pintura, escultura) e faziam parte de um mercado marginal, não reconhecido plenamente como arte.

Para a grande ironia do destino, nos últimos anos isso têm mudado drasticamente. Praticamente tudo o que se vê nas exposições de arte contemporânea no Brasil e no mundo é a ostentação da fotografia como mídia principal das obras. A pintura, soberana por tantos séculos, caiu na marginalidade a ponto de alguns artistas jovens começarem suas declarações com a frase "quando eu pintava..." (pasmem!) Hoje, pintar é considerado pelos conceitualistas e tecnologistas como algo arcaico e conservador, um hobby de senhoras idosas que substituem o afeto pela pintura e o fazem mediocremente. Só que são justamente essas pessoas imediatistas que são ignorantes do fato que a pintura ainda se faz presente e forte em outras partes do mundo.

Mas isso é assunto para outro post, estava falando da fotografia "ruim" que a gente vê por aí.

Meu marido é fotógrafo, e muitos de nossos amigos mais próximos também são. A grande maioria deles provém do meio fotojornalístico e não tem formação artística acadêmica (o que no fundo não é também nenhum problema). Com o recrudescimento do mercado editorial, muitos deles estão optando por iniciar uma carreira com seus trabalhos autorais, e assim, em meio de carreira, deparam-se com o meio das artes plásticas e suas vicissitudes de mercado em relação à fotografia. Se antes para eles a fotografia pura e clássica, a "apreensão do momento" e a vivência da foto-notícia eram o que determinavam o trabalho, agora todos têm que aprender questões das artes plásticas (que são universais) e inseri-las na fotografia para tornar o seu trabalho autoral crível de acordo com novos termos. Questões de escala, desenvolvimento de uma poética, técnicas de instalação, experimentação com novos elementos, começam a entrar na vida dos projetos. Neste novo ambiente, o tom de crítica é completamente diferente do mercado editorial e publicitário, porque vem com outras exigências, e exigências um tanto rígidas. Enfim, é como se mudassem de profissão sem ter que mudar o equipamento.

O que me cansa nesse debate se fotografia é ou não é arte é que acho que isso é uma questão ultrapassada. Na última Arco 2004, grande feira de arte mundial onde são exibidos trabalhos dos artistas representados por centenas de galerias, a fotografia reina absoluta como meio mais utilizado. E não é só na arte que se vê isso, a fotografia está em todo o ambiente urbano por meio da publicidade, nos jornais, revistas, da televisão e do cinema, em suma, a presença plástica mais unânime e mais globalizada é sem dúvida a fotografia. E por isso mesmo não entendo porque os fotógrafos ainda têm uma grande dor-de-cotovelo em relação ao "state of affairs" da arte contemporânea. Nós pintores é que devíamos estar revoltados por termos sidos dessacralizados pela tecnologia, ainda que ainda sejamos valorizados no mercado de arte. Mas nem só de mercado vive a arte, existe um fenômeno claro que nos leva à fotografia e ao vídeo, e cada vez mais a arte transgênica, net-art, e outros gêneros híbridos cuja presença não podemos negar. O pensador ou artista que negar este fenômeno no futuro corre o risco de ficar no lado obscuro da história. Mas a fotografia, nesse sentido, só apresenta vantagens! É o meio mais maleável e mais instantâneo que existe. É impossível que a fotografia "fique para trás".

Então acho que esse questionamento da fotografia ser arte ou não é cansativo e improdutivo. E esse questionamento sempre parte de um fotógrafo. Os artistas plásticos são muito mais tolerantes nessa questão porque têm uma postura inclusivista e não exclusivista da arte como um todo e de todas as suas possibilidades.

Imaginemos a situação inversa. Por alguma razão, todos os fotógrafos largam a fotografia e resolvem fazer pintura. O que acontece naturalmente é que a pintura vai sofrer uma mudança radical pois os fotógrafos vão trazer novos inputs. Os pintores inicialmente vão espernear, xingar, chamá-los de ignorantes e iconoclastas, mas depois de um tempo se apropriariam dessa nova estética para daí iniciar um debate sobre uma nova pintura. É, a recíproca é verdadeira....

Talvez, o que falta aos fotógrafos é darem uma "resposta" a essa nova fotografia aparentemente "ruim" e "mal-feita" e dialogar com ela. Uma crítica sobre a Arco 2004 diz: "...mi mayor duda es si esta eclosión de obras sobre soportes fotográficos supone un mayor conocimiento y respeto por el medio fotográfico. Una cosa es usar la facilidad actual que da la tecnología fotográfica para obtener imágenes a gran tamaño y otra hacer fotografías interesantes. Muchos artistas que nunca se habían planteado usar este medio, y que no conocen mínimamente la historia de la Fotografía, descubren un día que no necesitan mancharse las manos con pigmentos y óleos, sólamente con una pequeña camara digital pueden generar archivos que bien impresos en una ampliadora tipo Lambda pueden llegar hasta tamaños similares a los de sus lienzos... ¡y con mucho menos esfuerzo!.l problema de fondo es que al desconocer la historia del medio nos pretenden vender ideas e imágenes que estaban ya más que superadas.

Sim, pelo desconhecimento do meio pode-se chegar a conclusões e resultados comuns, ultrapassados, repetindo o passado e caindo no nada. Então, peço para os fotógrafos que nos elucidem ou nos mostrem os próximos passos da fotografia, que nos ensinem a olhar a fotografia como ela deve ser vista, o que faz de uma foto um boa foto e o que faz uma foto ser ruim. Melhor do que isso, nos mostrem trabalhos que realmente exemplifiquem a sua revolta sem botar a culpa no photoshop ou no artista plástico oportunista que fez uma foto "nas calças".

O que me parece é que a revolta dos fotógrafos parece uma questão de gueto. É necessário que se abra um debate sério sobre os rumos da fotografia para que possamos prosseguir com o andamento da arte e seus maravilhosos desdobramentos e descobertas.

Eu particularmente adoro fotografia, e mesmo não tendo formação em fotografia (sou formada em desenho) não abro mão da possibilidade de usar a fotografia como bem entendo. É claro que o meu desejo é sempre fazer trabalhos com a maior qualidade possível. E por justamente não saber fotografar direito ou com propriedade é que me aproprio dela ou corto em pedacinhos para depois fazer uma pintura que se baseia em fotografia, mas que no fundo é um debate meu com a pintura num momento em que a pintura não precisa mais de tinta para ser feita.

E vocês, o que acham? é arte ou não é? ( parece até coisa de Chacrinha....)

Link relacionado: FotoCultura

2.4.04

Imagens

no meu fotolog, as peças que irão compor a exposição...

in my fotolog, the pieces that will go into the exhibition.