30.5.04

Artigo do Jabor

Alguém, assinante do Estadão, poderia conseguir o artigo do Arnaldo Jabor chamado "Nem Cinismo: Tédio"? Agradeceria muito....

Susan Sontag

Há algum tempo venho lendo uma autora fantástica, Susan Sontag, e seus textos sobre fotografia e cultura contemporânea. Susan Sontag não se utiliza de filosofias francesas ou alemãs para sustentar suas teorias sobre o papel da fotografia na nossa era, mas o faz com confiança absoluta em suas observações e em uma prosa legível, ao contrário de muitos textos sobre arte.

No seu livro mais recente "On the Pain of Others", ou "A Dor dos Outros", revela uma profunda reflexão do cruzamento entre a arte fotojornalística e o nosso entendimento diante da narração visual de guerras e desastres na nossa era. Ela traz uma opinião fresca e bons argumentos sobre como imagens podem inspirar discórdia, incentivar a violência ou criar apatia através da descrição da longa história da representação da dor dos outros. Não sem coincidência, a capa do livro traz uma gravura de Goya, que, em suas gravuras dos "Caprichos" retrata todas as crueldades humanas, sendo a violência, a mais forte delas. Um dos melhores livros que li ultimamente.

O que ela faz essencialmente é estudar o aspecto de memória coletiva de acordo com as imagens que hoje definem a nossa percepção dos fatos mais cruéis da humanidade, através da fotografia.

Quando vi as fotos de Abu-Ghraib pela primeira vez, me perguntei sobre o que Susan Sontag diria sobre essas fotos e como elas mudam, definitivamente, a nossa percepção dos ocorridos de guerra, mas mais importante do que isso, uma análise do contexto em que foram tiradas e porque. Minha sogra volta de uma viagem a NY e me traz de presente uma edição do New York Times Magazine com um artigo dela, sobre exatamente este tema. Eu sei que é longo, mas vale a pena ler.

Um trecho de "Photographs are US:

For a long time- at least six decades - photographs have laid down the tracks of how important conflicts are judged and remembered. The memory museum is now mostly a visual one. Photographs have an insuperable power to determine what we recall of events, and it now seems likely that the defining association of people everywhere with the rotten war that the United States launched preemptively in Iraq last year will be photographs of the torture of Iraqi prisoners in the most infamous of Saddam Hussein's prisons, Abu Ghraib.

The Bush administration and its defenders have chiefly sought to limit a public relations disaster - the dissemination of the photographs - rather than deal with the complex crimes of leadership and of policy revealed by the pictures. There was, first of all, the displacement of the reality onto the photographs themselves. The administration's initial response was to say that the president was shocked and disgusted by the photographs - as if the fault or horror lay in the images, not in what they depict. There was also the avoidance of the word torture. The prisoners had possibly been the objects of "abuse," eventually of "humiliation" - that was the most to be admitted. "My impression is that what has been charged thus far is abuse, which I believe technically is different from torture," Secretary of Defense Donald Rumsfeld said at a press conference. "And therefore I'm not going to address the torture word." Words alter, words add, words subtract. It was the strenuous avoidance of the word "genocide" while the more than 800,000 Tutsis in Rwanda were being slaughtered, over a few weeks' time, by their Hutu neighbors ten years ago that indicated the American government had no intention of doing anything. To refuse to call torture what took place in Abu Ghraib - and in other prisons in Iraq and in Afghanistan, and in "Camp X-ray" in Guant¿namo Bay - is as outrageous as the refusal to call what happened in Rwanda a genocide. (...)


Divirtam-se...

Leiam o artigo todo.

28.5.04

É tudo farinha do mesmo saco (?)

Uma das coisas que me irritam em algumas curadorias internacionais é que sempre existe aquele rótulo "Latin-American Art". Isso basicamente comprime um continente inteiro, da Baja California à Patagônia, sob um único rótulo, como se fôssemos uma massa uniforme de artistas produzindo arte regional, tudo farinha de milho do mesmo saco. ou de mandioca. sei lá.

Como brasileira tenho tanto em comum com um boliviano quanto com um malaio. Só porque vivemos na mesma placa tectônica (o boliviano e eu) não significa que vemos o mundo da mesma forma. Mas para um norte-americano, qual a diferença faz o Brasil ou a Bolívia, é tudo com B mesmo e lá não falam inglês direito, fora isso são pobres e têm governos instáveis.

Um livro de arte americano chamado ArtToday dividido em vários capítulos temáticos, começa por temas muito específicos como "New York Style", "California Painters", "Young British Sculpture", "Land Art", deixando as artes de "gueto" lá pro final, quase como uma curiosidade. Nesse balaio está a "Feminist Art", a "Minority Art", a "Native Art" e é claro a "Latin American Art". Quer dizer, quando o assunto é primeiro mundo é tudo detalhado, específico. Passou para debaixo do equador ou para as "minorias", começam as generalizações, como se fôssemos padronizados, sem identidade, produzindo uma única arte baseada nas nossas mazelas de opressão oriundas de ditaduras. "Ah esses latino-americanos com suas ditaduras não têm voz própria, só nós os nova-iorquinos fazemos algo de realmente novo." O que consta no texto do autor é o "surgimento" da arte não-ocidental e das minorias no panorama da arte mundial. Ele está se referindo especificamente ao sistema de arte global comandado por quem tem mais dinheiro.

Ainda existe quem pense assim. Mas graças ao deus da arte contemporânea, há cabeças mais modernas e abertas que pensam diferente. Na Documenta de Kassel, por exemplo, evento de arte que ocorre a cada 5 anos, eles tomam o maior cuidado para não rotular artistas de acordo com sua nacionalidade, mas com suas linguagens visuais, com a preocupação de obter coerência com o total da obra e assim refletir tendências das artes plásticas mundo afora. Alguém está em sintonia no hemisfério Norte, está comprovado, mas vale ressaltar que a curadoria da Documenta é mixta, e inclui latino-americanos, além do curador-geral ser indiano. Menos mal, mas é exceção. Só nos últimos 5 anos a arte contemporânea brasileira têm ganho representatividade nas galerias lá do Norte. Finalment reconheceram que há qualidade aqui, e muito mais frescor do que as questões enfadonhas e batidas da arte européia e americana. A revolução do olhar agora mora aqui.

Outro dia, também, recebi um comentário assim: "Isabel, a sua arte não é brasileira..." Fiquei perplexa diante desse comentário, ouvi calada, depois fiquei pensando. O que quer dizer "arte brasileira"? Não faz mais de 80 anos, o Brasil era uma sucursal dos cânones artísticos europeus. A arte dita "brasileira" era quase inteiramente produzida por europeus imigrados ou convidados em missões artísticas, emulando um estilo completamente continental, com pouca ou nenhuma influência da arte indígena, ou a preocupação com a criação da identidade artística local. Foi só em 22 que começaram a pipocar os movimentos antropofágicos, os Abaporus, as sinfonias de Villa-Lobos. Depois disso os concretos romperam com as referências tropicais, querendo dizer ao mundo, "nós aqui também pensamos intelectualmente e abstratamente a arte", depois os neo-concretos vieram suavizar essa posição. Depois, a influência da Pop Art americana influenciou a Nova Objetividade, a repressão fomentou uma vertente política forte, e com o estímulo da loucura toda das instalações e de grupos como Fluxus e das performances chegamos a uma arte verdadeiramente global, a nossa com tempero baiano.

Nasci em 1975, em plena era de arte conceitual e minimalista, da explosão da Land Art e das instalações, do furor das performances e do unanimidade neo-concreta. Nos anos 80 a coisa virou um pouco mais para a pintura, mas já nos 90, quando comecei a estudar arte, a coisa já tinha se tornado multi-disciplinar e experimental de novo. Os anos 90 nos trouxeram as telecomunicação celular, a Internet e todos os processos eletrônicos/numéricos de produção de imagens, que estão disponíveis no mundo todo, para artistas do mundo todo. Todos assistimos os mesmos filmes, os mesmos canais na Tv a cabo, vestimos as mesmas roupas, participamos das mesmas guerras e compartilhamos a mesma informação. Eu vivo e sou ativa nesse último turbilhão. É uma libertação não mais ter que nos preocupar em pensar se somos tropicalistas com pinturas ensolaradas ou determinar que há razão nos trópicos além dos tucanos e papagaios. O discurso é muito mais sobre como transpôr fronteiras virtuais ou reais, e como manter qualquer tipo de singularidade diante dessa massificação/achatamento cultural em escala global, entre outras questões.

Então, o que significa "arte brasileira" ou ser brasileiro hoje? Sim, temos bons e jovens artistas expondo mundo afora, mas será que a importância deles é só porque são brasileiros ou porque têm trabalho fresco e inusitado? Porque teria eu que ser Concreta quando isso me precede em 2 gerações? Porque tenho que fazer referências a movimentos que não vivi só para ter uma identificação com o contexto local? Como Greenberg falava, cada movimento na arte vem resolver as questões deixadas em aberto pela geração anterior. Correto, o diálogo com o passado é fundamental, pois a arte não só usca a essência do artista mas também a essência da própria arte. Por outro lado, os artistas de outras eras, medievais, renascentistas respondiam também a questões do presente, e por essa razão a arte é um excelente instrumento para entender o pensamento de cada época. Hoje, o mundo se mostra tão pequeno e tão grande, os problemas da política mundial tão graves, a internet tão cheia de possibilidades. E essa é a minha experiência. Só posso ter um compromisso verdadeiro é com a minha experiência, e a minha experiência é do tempo que estou vivendo agora. Arte é uma mistura de essência e experiência, impregnação e intuição, reverência aos mestres e crença na invencão futura. Mas, voltando a esse meu amigo, a arte não tem nada a ver com patriotismo.

Só posso dizer uma coisa: vou mandar essa pessoa que me falou isso praquele lugar. Pra bem longe do Brasil.

27.5.04

Código Michelangelo

Hoje, durante uma excursão ao Centro do Rio, folheei o Código Michelangelo, que mencionei no post d anteontem. Bem, o livro é lindo, é sempre incrível ver Michelangelo, mas achei a tese toda um pouco cheia de suposições demais. Da maneira que escreveram o livro, eles mostram exatamente o que parece com o quê, mas algumas coisas realmente não são vistas a olho nu, custa para ter a mesma visão do tal médico, que viu o canal da uretra e o rim na perna do profeta Zacarias. Aliás, só um médico mesmo para ver certos detalhes... Mas o livro é interessante, talvez um pouco subjetivo, mas o que em arte não é?

Não à arte como decoração

O que eu penso sobre a arte o Singrando pensa sobre a música. Ele diz que música não é acessório, não é decoração, não é cenário para sala de espera, e traça um paralelo: "Existem pessoas que ao comprar um quadro, perguntam "Não tem com tons laraja, para combinar com meu sofá?".. Pois é, esta é a dura realidade. Às vezes, pra sobreviver, temos que vender o tal quadro en tons laranja. Pode até ser uma fotografia pornográfica, uma cena de tortura, ou pistilos de orquídeas, desde que sejam em tons de laranja.

O artista às vezes não tem moral. Prefere pintar um quadro pra combinar com o sofá de oncinha a passar fome.

26.5.04

Buscando ética

A melhor parte das estatísticas do acesso deste blog são as buscas que as pessoas fazem na internet e acabam caindo aqui. Eu sempre acesso os keywords que as pessoas digitam para ver o que aparece.

Tem gente que já buscou por "desenho de papagaio" e caiu aqui, mas hoje passou um novo leitor por aqui procurando por "ética na arte contemporânea".

Quem busca por "ética na arte contemporânea" no Google espera encontrar o que exatamente? Um tratado póstumo de Spinoza? Ou melhor dizendo, quem procura por "ética na arte contemporânea" espera encontrar alguma ética na arte contemporânea? Espera encontrar alguma ética no meu blog? Ou na minha arte?

Adoro quando o Google é confundido com um orágooglo, oops, oráculo.

24.5.04

Redundâncias e Coincidências (ii) - Michelangelo e a aula de anatomia

Li na Época desta semana uma matéria muito intrigante, O Código Michelangelo sobre um médico que encontrou inúmeras referências à anatomia "escondidas" nas composições dos afrescos da Capela Sistina, de Michelangelo.


"A semelhança entre o corte do crânio e a cena da Criação do Mundo já tinha sido estudada, mas não a linguagem do olhar dos anjos..."

A ligação da arte com a medicina sempre foi muito estreita. Um médico e um artista têm em comum uma acuidade de observação e de pensamento abstrato, pois da mesma forma em que um médico precisa saber visualizar a estrutura de células invisíveis a olho nu, um artista precisa de um olhar atento para traduzir o que vê e o que imagina em termos plásticos. É sabido que os grandes pintores da renascença dissecavam corpos afim de saber desenhar a figura humana com mais precisão, mais anatomicamente. O interessante desse estudo é que este médico, e outros antes dele, encontraram similaridades não só em como os corpos eram desenhados, mas em como algumas estruturas ósseas e orgânicas refletem na composição de um afresco de Michelangelo, com bastante precisão.


No afresco A Criação de Eva, ocultam-se um segmento da árvore brônquica (no detalhe) e a peça anatômica do pulmão esquerdo, fielmente reproduzida no manto.

Trecho do artigo:

..."Ao dissecar um cadáver e deparar com um corte de arco aórtico idêntico ao que vira na Sistina - inclusive com as artérias coronárias esquerda e direita -, imaginou que Michelangelo houvesse usado a peça anatômica como evocação figurativa. Afinal, os renascentistas eram fascinados pela anatomia humana e brincavam com as formas. Gilson concluiu a especialização em cirurgia de cabeça e pescoço. Nesse ínterim, colecionou livros sobre Michelangelo. Em 1990, leu um artigo sobre a descoberta do médico americano Frank Meshberger. Ele demonstrava que, na cena central da Sistina, a famosa A Criação de Adão, o manto de Deus representava um corte sagital do crânio e o cérebro nele contido. No hospital em que trabalha, em Campinas, Gilson passou a usar o afresco para ilustrar suas aulas de cirurgia. Em 2001, o médico leu outro artigo, do nefrologista americano Garabed Eknoyan, o qual demonstrava que Michelangelo pintara um fígado no manto de Deus no painel A Criação de Eva....

Leia mais em O Código Michelangelo

Redundâncias e coincidências (I) - Goya e o Iraque

Sempre achei a história meio burra, repetitiva. O homem não aprende nada nunca, sempre faz a mesma merda. Mas é justamente essa qualidade ultra-humana que nos dá as maiores coincidências, algumas totalmente indesejadas.


Autor desconhecido, As torturas de Abu-Ghraib, 2004


Francisco de Goya, The shooting of May 3rd,1808, 1814

Goya era um atento observador das situações humanas, e das des-humanas também. Esse quadro representa uma das melhores pinturas de guerra jamais feitas. Reparem na mesma paleta de cores nas 2 imagens, na tensão das diagonais, tema, posicionamento da vítima quase idêntico e de quem é o único rosto que se vê. É também o único personagem de frente pois os algozes estão escondidos pelas suas costas e pelos seus rifles, como se não tivessem rosto nem particularidade. Este não são retratos de um torturado, são retratos de uma guerra.

The art of waiting

Texto excelente encontrado no London Mark, sobre a arte da espera;

The art of waiting
"I have no idea how much time the average human adult spends waiting for things, but I am prepared to wager a small amount that it is a substantial part of his/her life. In any given interaction between two or more people which requires them to be in a specific place at a specific time, waiting will form a key part. At the tube station, in the coffee shop, outside the cinema – even behind the bike sheds when you were younger – there is always waiting.

The first thing to remember about waiting is that it is invariably someone else's fault. You wouldn't be waiting if they had decided to stop being useless, selfish, time-wasting morons who don't really deserve to be going to the concert/film/play/meal with you in the first place. Also, they are sufficiently annoying that they are keeping you waiting. As any fool can see, you are the person who should be keeping them waiting. We hold this to be self-evident."


Does this look anything like it?


23.5.04

Michael Moore 1 x 0 George Bush

Não foi linda a vitória do Fahrenheit 9/11 em Cannes? Ou não seria melhor comemorar a grande derrota de George Bush em Cannes? Talvez este seja o primeiro filme na história a conseguir derrubar um presidente. Ainda há solução neste mundo. Viva Michael Moore.

Arte 1 x 0 Política Americana.

______

Mas, americano é mesmo vendido, e até nisso o Michael Moore escancara, inclusive fora do filme. Quando a Disney se recusou a distribuir o filme, um monte de arroz-de-festa sairam na imprensa tachando o Fahrenheit 9/11 de anti-americano. Agora que ganhou a Palma de Ouro, os mesmos estão saindo no tapa pra ver quem vai distribuir. E a Disney com cara de idiota vendo a grana que eles vão perder. Aquele velho dilema americano: a ideologia ou o dinheiro? Todo mundo sabe o que eles acabam escolhendo...

21.5.04

Fim de Papo

Diálogo frequente de uma artista digital com o mundo da arte no Rio de Janeiro:

Interlocutor: Isabel você é artista? Você faz o quê?

eu: Tenho formação em desenho e pintura, mas atualmente faço arte digital, principalmente com Internet....

Interlocutor: Isso é arte com computador, né.

eu: Sim. Mas o computador é apenas uma ferramenta, o meu trabalho depende do computador sim, mas o mais importante são as questões que eu abordo nos meus trabalhos como identidade, privacidade e amor que só acontecem pela Internet. Eu me interesso em como as pessoas interagem com a Internet por meio das imagens que elas colocam em circulação na rede através de websites ou câmeras de vigilância, e dispositivos como GPS, e .....

Interlocutor: (me interrompendo, com olhar confuso): GP o quê? Não entendo nada de computador. Mal sei checar e-mail.

fim de linha.





20.5.04

Picasso e arte pública no Rio

Marketeiro acha que é realmente genial. No Globo de hoje noticiaram o lançamento do Xsara Picasso junto às obras do Picasso, na mostra na Oca, no Parque Ibirapuera. Foi a primeira vez em que esse modelo de carro foi mostrado junto às obras do seu homônimo. A pergunta que fica é: as pessoas que foram a esse coquetel foram para ver o carro ou as obras? Nenhuma das duas: as pessoas foram mesmo para continuarem suas carreiras de arroz-de-festa porque nem olham as obras com suas tulipas de prosecco nas mãos, mas talvez saiam de lá com um Picasso a preço popular. Na semana que vem todo mundo aparece em Caras. E assim caminha a nossa ignorância...

Enquanto isso, na França, some um Picasso de 3 milhões de dólares....
_______

Finalmente a Secretaria da(s) Cultura(s) do Rio se tocou de que é necessária uma comissão séria e profissional para avaliar as pífias obras de arte pública que ocupam a cidade. A comissão é composta dos tops da arte no Rio de Janeiro, entre eles Paulo Herkenhoff, Carlos Zilio, Ernesto Neto e outros, para julgar projetos de arte pública e assim garantir que as esculturas instaladas nas nossas vias públicas tenham um mínimo de qualidade e adequação ao ambiente urbano. Isso tudo para desbancar de vez uma certa escultora carioca, Marly Mazeredo, que vem inserindo suas esculturas medíocres na cidade com financiamento público e privado e sem licitação da prefeitura em alguns casos. Dizem que esta senhora tem costas quentes, mas acho que agora vão começar a esfriar, e abrir o caminho para obras de qualidade no nosso espaço urbano.
Leia mais em Tribuna da Arte Pública. no Globo.

19.5.04

Latinarte

Vai aí uma dica de site muito bem feito sobre arte latino-americana recente, o Latinarte, para quem quer conhecer um pouco mais sobre art efeita no nosso continente. É uma galeria virtual e inclui vários dos clássicos da arte moderna até os experimentais mais contemporâneos.

Não sei se por acaso, mas de 5 artistas que descobri lá e de quem mais gostei, 4 eram argentinos. não sei o que isso quer dizer, mas lacan ou freud devem explicar.

Tem uma frase lá que eu gostei especialmente que diz que as experimentações do século XX deram vazão à liberdade desenfreada da arte nesse início de milênio. Falou e disse.

A coisa primeira

Diz o meu mestre que a arte se resume a 3 coisas:

impulso vital

obsessão

intransigência


O resto é logística, sobrevivência, babaquice.

Não se esqueçam da coisa primeira.

17.5.04

Re-Construtivismo

Em conversa com outros artistas, chegamos à conclusão que a única saída para a arte contemporânea, e para a arte em geral, é retornar, ou melhor, evoluir, para o construtivismo. Cansamos dessa coisa pós-moderna, pós-estruturalista, pós-linguistica, e principalmente, cansamos dos filósofos alemães (Wittgenstein, Kant, Hegel, Schopenhauer, etc...). Optamos por um retorno aos gregos, por uma visão mais inteira do mundo, por uma visão mais apoiada na lógica do que na ilustração de pensamentos teutônicos. Já vimos a arte morrer de todas as formas, e ressuscitar, e morrer de novo. Sempre tem um Fukuyama de plantão para matar a história do que quer que seja. Cansamos do apocalipse e da paisagem desértica do futuro da ficção científica.

Prefiro arriscar uma vertente construtiva sem a parafernália ideológica dos russos de 1917, para realizar a arte através da construção de conceitos e não destrui-la através do conceito. Destruir é muito fácil, difícil é criar. Duchamp já dessacralizou tudo, não precisamos mais passear por essas bandas. O resto já foi todo visto. A novidade está na construção, mas o que proponho mesmo é re-construir.

Isso obviamente me coloca num lugar muito confortável porque nunca consegui realmente entrar nessa onda do desmembramento, do desarranjo, da des-figuração. O meu trabalho sempre foi orientado à criação de ilusões óticas e à construção de imagens seja a partir de uma referência, seja a partir do zero, ou reconfigurar estilhaços de algo já destruído para criar algo das "cinzas", embora sub-serviente a uma idéia, ou conceito, anterior.

Me parece que esse é um caminho mais fértil. Gosto da arte, não quero matá-la.

15.5.04

Sofrimento

Até que a paisagem foi fácil de fazer. Céu escuro, montanhas em silhueta, agua turva e turbulenta.

O bicho pegou foi no barco. Fragata em chamas naufragando com velas ao léu e mastros quebrando, com o detalhe que tudo isso tem que acontecer em um ângulo de "queda".

Ainda estou ralando. Sem dizer que consegui uma extensão no deadline...

14.5.04

Jabá

Hoje me chamaram pra ilustrar capa de livro. O meu primeiro jabá no mundo da ilustração.

Antes de saber qual era o tal assignment estava eu lá mostrando o meu portfolio com um monte de desenho maluco, 50 desenhos abstratos de gatos em aquarela, o meu projeto de arte digital, os tedium rooms, tudo. Eu crente que ia rolar uma capa de um romance adulto em que era só encaixar um desenho pré-existente e pronto. Mas no final, o cara me mostra as capas do assigment: romance de aventura de náufragos e bucaneros para adolescentes imberbes, capa no estilo realista, a óleo, com mood de mistério e aventura.

Putz, pensei. Nunca desenhei um barco na vida, quanto mais naufragando. E ainda por cima o naufrágio aconteceu à noite, e pior ainda, tem um menino que sobrevive o náufragio. Vários problemas: não sei desenhar barcos, não sei desenhar noite, e muito menos sei desenhar o garoto se salvando ali, na surdina, dentro d'água de forma realista a óleo. Aliás, detesto pintura realista. Fudeu.

Pensei na dívida do cheque especial, os impostos da empresa atrasados, o dinheiro que devo à minha mãe, na casa da minha sogra (onde moro), e topei os 650 pau.

Passei a noite à espera de um milagre. Será que uma fragata vai naufragar na baía da guanabara? Mais fácil, assim eu fotografo e beleza. Olho pela janela e nada de fragata e muito menos naufrágio. Sento no computador pra ver email, se alguém visitou o blog e nada me vem à cabeça. Fui dar uma volta, ver umas livrarias, achei a maioria das capas de livro de adolescente meio bobinhas, e nada que me inspirasse. Quer saber? voltei pra casa, sentei no lap e apelei, fui no google images, procurei umas imagens, cola daqui cola dali, imprimo a montagem e lá vou eu decalcar na mesa de luz. Aliás nem sei se o tal barco naufragado tem 2, 3 ou 4 mastros, na dúvida desenho todos eles quebrados com as velas rasgadas, bem clichezão mesmo e dane-se.

Ficou uma merda. Parece as ilustrações que eu fazia pro jornalzinho do colégio quando tinha 15 anos quando nem sabia direito quem era Michelangelo. O menino ficou com corpo de espantalho, a nuvem negra virou uma mancha negra sem nada de céu. Não soube fazer as ondas batendo nos rochedos.

Na tentativa de consertar o desenho, escaneio e passo um filtro "watercolor" no Photoshop pra tentar esconder o fiasco. Algusn truques de desenho e me safo.

Minutos depois: - Me odeio.

Ficou exatamente como aquelas ilustrações horrendas de capas de livros de auto-ajuda daquelas editorazinhas vagabundas do interior. (Indignada:) pô, eu estudei fora, falo 5 idiomas, não vou me deixar derrubar por um desenhozinho de merda valendo 2 trocados!

Deadline: amanhã.

f.....

12.5.04

Art in the Office

Se já não bastam as inúmeras galerias em NY, os artistas ainda inventam de fazer instalações de arte em escritórios corporativos. Pensando bem, ambientes corporativos precisam mais de arte do que as próprias galerias, para tornar o ambiente de trabalho um pouco mais "humanizado". Não estou falando daquela arte enfadonha que se bota nas paredes ou daquelas pobres plantinhas que decoram os cantos das salas de espera ou de reunião, mas sim de instalações que questionem a natureza daquele lugar. Tenho uma série inteira desses espaços que chamo de "Espaços do Tédio", lá no meu fotolog. O projeto original vai mais além do que está no fotolog, mas já vale a amostragem.

A resenha da exposição:

"Art in the Office"

THE GLOBAL CONSULTING GROUP
22 Cortlandt Street, 14th Floor, Public viewings: April 16, 10–12pm; April 30, 3–5pm; May 14, 12–2pm.
By appointment: Contact Chris Allieri at 646 284 9450.
March 25–May 21

 With a view toward a beneficent yet up-to-the-minute public image, the corporate communications firm Global Consulting Group is hosting a contemporary art show in its Financial District digs. New York artist/curator Matt Keegan rounded up the thirty-odd contributors, most near the beginning of their careers. Some take gentle nips at the hand that feeds them; others inject playfulness into the buttoned-down environment. Martha Friedman has installed a pyramid of hyperrealist polyurethane-foam cantaloupes on a conference-room table; across the hall, artist-in-residence Pia Lindman meets with staff members to construct a gestural vocabulary of the workplace, from "boo-yeahs" to the finger-pointings that mean "I'm on the phone." A video captures her end of the exchanges, and minimal drawings of the gestures line the walls. Employees love Rachel Foullon's redecoration of the break room for its warm brown color scheme and mellow lighting (and are unfazed by her oblique allusions to the Donner Party). Other works include a melancholic digital piece by Paul Ramirez Jonas and a similarly keyed video by Alex Villar; online projects; and an "art resource cubicle." Daniel Bozhkov's stained-glass citrus tree on a southerly window casts gorgeous yellow, green, and orange glows in the afternoons: In an office context, such sensual appeal practically constitutes a critique.

—Domenick Ammirati na Artforum

Eu quero o meu visto cassado também

Vou começar a falar mal do Lula no New York Times também.

Quem sabe assim me deportam dessa espelunca de país logo.

11.5.04

Nem uma folha-de-parreira resolve

Até nos dias de hoje, em pleno terceiro milênio, artistas sofrem com todo tipo de censura.

A notícia recente na BBC, A Northern Ireland council has been accused of censorship after full frontal nude drawings were left out of an art exhibition sobre a censura de desenhos que exibiam desenhos de nus frontais não é coisa de hoje. A artista britânica Alison Lambert iria expor 8 desenhos grandes de corpos humanos, e acabou somente deixando os nus não-frontais, tendo que substituir os 4 nus frontais com outros desenhos mais antigos.

Pra começar, os desenhos foram censurados na Irlanda do Norte, que , como se sabe, é ultra-católico. O que a Higher Bridges Gallery alega é que as obras não são consideradas de conteúdo apropriado para crianças. O Vaticano, no período da Renascença, mandava que pintassem folhas de parreira em cima das genitálias de todos os Adãos e Evas, Davis, e assim, pintores medíocres pegavam um pincelzinho e saíam por Roma inteira pintando folhas de parreira para esconder "as vergonhas"que não tinham nada a ver com o estilo do quadro ou afresco. Podia ser Giotto, Michelangelo, Da Vinci, Botticelli, tanto faz. Era pra esconder e pronto e hoje, centenas de restauradores são contratados para apagá-las e restaurar as obras a seu "estado" original.

Mas esse caso da Irlanda do Norte é pior porque simplesmente vetaram as obras sem negociar uma folha-de-parreira sequer. E isso em plena era tecnológica em que qualquer criança ou adolescente assiste a Britney Spears e Madonna na televisão praticamente semi-nuas, sem falar nas pronografias vistas pela Internet e outras "interferências" da mídia. É mais do que hipócrita impôr uma sanção dessas a qualquer artista, muito menos impôr uma sanção destas ao público.



Podemos alegar que a Higher Bridges Gallery tem direito de expor o que quiser e selecionar os artistas que lhe derem vontade. O que ela não pode fazer é, uma vez que aceite expôr obras de um artista, chegar nos 45 minutos do 2o. tempo e vetar trabalhos alegando uma questão moralista à revelia do artista, pois a galeria aparentemente devolveu as 4 obras "censuradas" pouco antes da abertura, não deixando à artista a opção de não participar. Resultado, consumou-se a censura e teve que repensar toda a mostra com outros desenhos que pouco tinham a ver com a intenção da mostra. No meu país, isso chama-se rompimento de contrato passível de processo.

A ironia é que a mesma exposição, completa com os nus frontais (que, diga-se de passagem não têm nada de pornográficos), teria sido muito bem aceita, por crianças inclusive, na Inglaterra. A artista alega que os desenhos mostram a fragilidade humana, e acredito nela. E são lindos.

É aquela velha guerra santa insolúvel....

10.5.04

Artista bom é artista morto.

Artista só vale alguma coisa depois de morto, principalmente se for branco, homem, e europeu.

Essa é uma das maiores e mais falaciosas generalizações no mundo da arte. Picasso, que acaba de ter um quadro seu leiloado pelo preço récorde de US$104 milhões, faturou muito bem durante os seus 92 anos de vida. Produziu como poucos e sempre esteve "na mídia". Picasso deve ser o recordista de vendas em vida e póstumas. O quadro vendido pela Sotheby's é realmente sensacional, e um quadro importante feito por ele poucos anos antes da "grande revolução do olhar" que ele mesmo causou com o Demoiselles D'Avignon, que incontestavelmente revolucionou a arte do século XX e com certeza causou uma ruptura definitiva com os 10,000 anos de pintura que o antecederam.

Gostem ou não, foi o maior gênio.

Patrocine um artista vivo

Nos meus tempos de estudante na faculdade de arte, inventava algumas performances. A minha performance de maior sucesso foi a "patrocine um artista vivo". Segurava uma placa com esses dizeres na entrada da aula de história da arte grega e uma canequinha com moedas na outra mão, esperando algum tipo de compaixão. Numa festa a fantasia na mesma faculdade, achei uma moldura antiga num sebo, pendurei a moldura na cabeça e escrevi esta mesma frase na cara.

Anos depois, no flog/blog do meu melhor amigo, Alexandre Cruz Almeida, o Liberal Libertário Libertino, com sua perspicácia usual, flagra a seguinte imagem na frente do Museu Nacional de Belas Artes no Rio:

8.5.04

8 de maio - Dia do Artista Plástico

Quem diria, até artista plástico tem dia. Hoje vamos pintar todos as paredes cegas de prédios insossos no centro da cidade! vamos implodir as galerias! vamos sentar na praia de ipanema para uma grande performance coletiva! vamos incendiar os dogmas e criar novos paradigmas, manifestos, cartas ao president da república! Vamos mostrar a que viemos!

OU simplesmente, vamos pelamordedeus passar um diazinho sem pensar no futuro da arte contemporânea. Por favor.

7.5.04

Fotografia é luz

Voltando ao assunto "o que é fotografia?", vi esta definição genial. Simples e óbvio como tudo o que é genial:

“So many photographers, consumed by the elements of composition and timing, have departed from the fundamental idea that our chosen medium deals primarily with the recording of light. I view photography not in terms of its ability to capture a moment, but rather in its potential to glimpse the details that our eyes cannot. I use it to study a moment after-the-fact, and thus gain insight into the quiet nuances that foster significance during the moments in which our existence seems most important.

Veja o Portfolio de Andrew J. Shapiro

6.5.04

Lygia Pape

A arte brasileira acaba de perder uma grande estrela. Nascida em 1929, em Nova Friburgo, Lygia Pape faleceu no dia 4 de maio, às 18:30, justamente durante o eclipse lunar.

Me identificava com ela embora nunca tenha conhecido-a pessoalmente. Existe um livrinho maravilhoso que consiste de 60 páginas com uma longa entrevista com ela onde narra a história de sua carreira desde o concretismo até seu papel na formação do movimento neo-concreto e por todas as fases (e eram muitas!) que passou até os dias de hoje. E como era uma mulher muito inteligene e perspicaz, a entrevista é uma delícia de leitura.

Lygia nunca fez concessões com seu trabalho. Concretizava suas visões que ora podiam ser em pintura ora em instalações, vídeos, objetos. Enfim, fez de tudo um pouco além de ser exímia programadora visual, que aliás era a forma como ganhava a vida, dado que a rejeição ao seu trabalho artístico não lhe permitiu muita penetração no mercado de artes. (Pra quem não sabe, é dela a autoria da identidade visual de todos os biscoitos Piraquê, uma forma de trazer o neo-concreto para o nosso cotidiano...)

Foi só quando Mário Pedrosa a descobriu que todos começaram a levá-la a sério. Também pudera, enquanto todos os homens de sua geração exibiam obras pertencentes a uma trajetória linear e concisa, Lygia atirava para todos os lados, e logo, não conseguia-se ler a sua obra de forma contínua. Poucos viram, de início, que se tratava de uma artista multi-disciplinar que transcendia todos os meios em que se metia. E isso para um meio dominado por homens, tanto os artistas quanto os críticos, era sinônimo de diletância ou de loucura.

Quem não se lembra da instalação "Carandiru" de 2002, em que construiu uma cascata de água vermelha representando o sangue dos 111 prisioneiros derramando no antigo presídio dentro do Centro de Artes Hélio Oiticica? E os balés neo-concretos, em que formas de dança geométricas se coordenavam com sons de música experimental? E as "Ttéias", sublimes esculturas feitas com fios de ouro? Pois é, essa era Lygia, sempre uma nova revelação, e sempre uma surpresa. Por fim, Lygia também fazia livros como o "Livro da Criação" sem texto ou palavra, só imagens ou recortes.

Lygia Pape's work represents the permanent desire, often realized, of constant transformation," said Rio de Janeiro gallery owner Jean Boghici, who represented the artist. Leia o artigo todo.

Amén.


5.5.04

New Media Art

Descobri um site maneiríssimo que congrega artistas da so-called New Media Art: Rhizome. Fala tudo sobre Net Art, projetos interativos e uma lista enorme de atistas que usam o meio eletrônico como eixo central de seus trabalhos de arte.
Os projetos são dos mais variados, desde a navegação longa e demorada através de uma imagem microscópica até o "AudioBored", que vem com esse tipo de descrição:

The space of a phone conversation, even a conference call, is different than that of most net-based communications like email, blogs, chat rooms, and lists. But what exactly is the difference? 'Audiobored', a recent artwork by Dublin-based Jonah Brucker-Cohen, though not offering any answers, does present a chance to experiment with the spaces of global communications and draw your own conclusions. The work creates a connection between a (free) phone number that allows you to leave a message - with a digital operator - and a web site that provides access to previously recorded messages.

Não é o máximo? I love this techno-time we live in...

3.5.04

Profissão legal: artista plástico

Encontrei uma pérola num site direcionado a pre-universitários, o Universia Brasil na seção "Profissões". O texto é bem explicativo, bacaninha, mas tem umas coisas que eu leio com um certo cinismo, e adiciono a minha porção:

Mais que uma profissão, ser artista plástico é uma forma de viver, colocando poesia visual, sonora ou corporal no cotidiano das pessoas. Muitas pessoas ainda acreditam que arte é apenas inspiração, mas, na verdade, também é, e principalmente, transpiração, trabalho, experimentação, pesquisa. Para materializar um insight, o artista necessita não só conhecer as linguagens plásticas, mas também de muita energia.

...e passar boa parte da sua juventude transpirando na maior dureza, condição em que precisa de bastante energia apenas para se manter vivo.

Como a profissão ainda não é regulamentada, não há uma legislação que controle o seu exercício, o que colabora para a ampliação do leque de trabalho, que será tão aberto quanto maiores forem as habilidades que o artista demonstrar .....

...ou seja, se alguém de chamar de burro só porque é artista ou se uma galerista te roubar, não existe nenhum amparo legal. Mas por outro lado, também não sei como aconteceria a tal "regulamentação da profissão". Imagina só um monte de artistas constituindo um sindicato e estabelecendo seus direitos. Participo da associação de artistas do meu bairro, e funciona muito bem, mas sempre quando o papo envereda pelo lado legal, da criação de um sindicato todo mundo fica meio em silêncio.

Muitos artistas acabam trabalhando em criação publicitária, produção gráfica (capas de livros ou editoração eletrônica), design, criação de vitrines, desenhos de figurinos ou de cenários para televisão e teatro. Ou seja, se a atividade é lidar com aspectos visuais, haverá sempre um lugar para o artista plástico.

...é, triste destino. O cara entra na universidade cheio de vontade de fazer um trabalho autoral, próprio, explotrando a própria poética e quando cai na real, tá virando noite numa agência de publicidade qualquer retocando imagem no photoshop.

2.5.04

Batendo o pé

Não gosto de sectarismos tanto quanto não gosto de imitadores e plagiadores. Não gosto também de quem espera que artistas jovens pintem como os impressionistas porque isso é o que consideram arte. Achar que a única pintura que existe foi a impressionista é um desejo secreto de que o tempo não mude e não avance ou simplesmente não querer enfrentar o medo que se sente quando não se entende nada.
Gosto menos ainda dos teóricos-over que tentam racionalizar qualquer tentativa que um artista tem de expressar a sua visão.

Escrevo sobre o que observo com olhos mais ou menos tendenciosos.

Quando foi a última vez que você ficou mais de 1 minuto diante de um quadro?

E aí você vai a uma exposição para ver se os seus olhos ainda têm a capacidade de pensar em apenas olhar uma forma. Procura o estranho ou o familiar?

O que vejo é um sistema de arte reduzido, perverso, e esquizofrênico que ora age como uma meritocracia ora como oligarquia.

Galeristas esnobes, artistas medíocres mas bons-de-papo, outros artistas maravilhosos mas que não sabem se vender. É um jogo de interesse mútuo em que o valor da novidade ou de mercado é o que dá as cartas. Numa exposição, os custos de mídia são infinitamente superiores ao custo de produção das obras. É uma inversão de valores onde o relato é maior do que o fato.

A arte vive de seu passado, mas opera de acordo com o seu futuro. Todos queremos que a arte nos elucide o incompreensível e o intangível, mas ao ver algo novo, ora temos uma reação de repulsa, se não temos o aparato para entender a próxima revolução, ora nos libertamos porque encontramos algo novo. Arte é isso, o encontro com a invenção e com o não-usual, o não-esperado. Todo o resto é imitação.

Pouco me importa se este "novo" de que falo seja em forma de meias de nylon enroladas na cabeça ou uma singela pinturinha despretensiosa. O que nos resta nessa sociedade tecnocrata é encontrar as brechas no sistema para o espírito e o inesperado, como se fôssemos hackers ou bugs que paralisam o firewall por alguns instantes, para depois as coisas retomarem o seu fluxo "normal" (o que quer que seja ).